sábado, 20 de agosto de 2011

Da força histérica. Ou da última vez que entrei em luta corporal


Quando, leitor, foi a última vez que vc entrou em luta corporal?

Arrisco-me que a dizer que a ser homem o leitor ele pensará “Há alguns meses” e a ser mulher, pensará “Há alguns anos”. De certa forma a disputa é injusta, pois o organismo masculino bomba testosterona em quantidades muito superiores ao organismo feminino, propiciando-os a reações violentas. Agradeço a Deus por ser mulher e não ter minha disposição psicológica viciada por hormônios que me tornem propensa à violência. Inclusive, em meu último hemograma, o nível de testosterona estava abaixo da média até para as mulheres, e creio que isso seja parcialmente responsável por algo de minha “placidez”. Será que somos apenas títeres de nossos hormônios? Talvez, e não somente.

Um chimpanzé de 50 kgs tem 5 vezes a força de um humano de 50 quilos. Para além das diferenças musculares entres as espécies, soube recentemente por um documentário na TV a cabo que seres humanos têm latente e inexplorada força muscular semelhante a de nossos primos-irmãos símios. Porém humanos têm mais desenvolvido que os chimpanzés o córtex frontal, a sede da razão, que nos humanos limita o acionamento das fibras musculares. Somos mais fortes do que nos achamos.

Essa capacidade muscular latente não pode ser acessada intencionalmente, apenas em situações em que a atividade do córtex frontal é cerceada por estímulos mais poderosos que os da razão. Como o instinto de preservação da espécie. Portanto esta força “extra” dorminhoca é colocada em ação em situações que fogem à “normalidade”. O nome disso é “força histérica”, acionada quando a razão é suprimida e o instinto aflora.

Leitor, vc é capaz de, sozinho, suspender e mover um carro que pesa mais de 1 tonelada? Creio que mesmo os halterofilistas dirão que não. Pois é, leitor, vc é capaz. Dependendo de quem é vc e de quem está debaixo do carro. Se vc estiver completamente histérico, vc conseguirá. Se vc como transeunte ver um desconhecido ser atropelado e gemer embaixo de um carro, vc não conseguirá fazer nada por ele. Já se a pessoa embaixo do carro for seu filho, aposto e ganho, mesmo a mais mignonzinha das mães, é capaz de levantar mais de uma tonelada ao acionar plenamente sua força histérica, que ela nem sabe que tem. No programa televisivo citado mostraram 3 casos de parentes e amigos que diante de acidentes moveram, sozinhos, veículos automotores para livrar pessoas de sua estima de um perigo iminente de vida.

Assistir ao programa fez-me pensar sobre se algum dia eu acionei minha força histérica. E cheguei à conclusão de que sim, há 20 anos. Na última vez em que entrei em luta corporal com alguém. Esta não foi a derradeira vez em que fui ameaçada de ser agredida fisicamente, mas foi a última situação de perigo físico a qual não pude me furtar de levar ao cabo.

Eu tinha 9 anos.

(Creio que o número é auto-evidente...)

Estava na terceira série na Escola Estadual Jackson de Figueiredo, na rua Itapura, a menos de 100 metros da vila operária do Tatuapé na qual eu residia, à pensão de Dona Rosa Ross da Silva. Naquele dia eu fui à escola com a tiara mais linda que eu tinha, branca, com rendinhas e uma bonequinha em cima. Eu amava a minha tiara. Durante o intervalo um menino da minha sala, sob pretexto de estar brincando, arrancou a tiara da minha cabeça e começou a me gozar.

Eu tinha 9 anos e meus brios virginais se exaltaram como só alguém que não tem o rabo preso com nada nem com ninguém pode se pavonear. Já com a cara vermelha, corri atrás dele pelo pátio berrando:

- Devolve meu arquinho AGORA!!!!

Demos algumas voltas, ele rindo-se, eu urrando de raiva. Era minha tiara mais preciosa. Num canto ele parou, e eu em frente a ele. Disse num tom de deboche pelo fato de eu ser menina:

- Vc quer seu arquinho? Vem pegar! Quero ver conseguir!

Aí ele me ofendeu. Para além de desdenhar de mim como sua colega, ele estava a tripudiar de minha condição feminina! Avancei um passo em sua direção e ele, achando que com isso romperia meu intento e me poria a chorar, segurou o arquinho entre as duas mãos e Ták!, o quebrou ao meio. Tanto ele quanto eu desconhecíamos a existência da força histérica. Ele a descobriu dolorosamente, e eu com espanto.

Arquinho quebrado, no átimo seguinte lhe dei um soco no peito com uma força que eu não sabia ser capaz e meio instante depois apliquei-lhe uma rasteira nas pernas com uma destreza que eu não sabia ter. Ele caiu pra trás e sua cabeça fez um barulho seco ao atingir o chão. Por meio segundo temi tê-lo matado. Mas rapidamente ele começou a chorar como uma menina. Como eu, sendo menina, jamais chorei em público. Portanto, retifico: ele não chorou como uma menina, chorou como uma bichinha. Com todo o respeito aos homossexuais. :)

Lembro-me ainda hoje com prazer da sensação de arrancar meu arquinho, mesmo quebrado, de suas mãos, enquanto ele se debulhava em lágrimas. E de como caminhei altiva para o grupo de minhas amigas e de como elas passaram a me respeitar muito mais depois de eu demonstrar ser capaz de fisicamente me impor contra um menino, tê-lo posto para chorar e dado-lhe uma bela lição.

Neste dia voltei pra casa com meu mais lindo arquinho de cabelo quebrado. Mas com a sensação triunfante de saber que menino nenhum era páreo para mim. E com a certeza de que eu jamais me deixaria subjugar fisicamente por um homem.

Este coleguinha foi o último homem a se impor fisicamente contra mim. Nunca fui atrás de namorados que se dessem ao desplante de cogitar me agredir. Talvez isso seja devido à auto-confiança que este episódio infantil me garantiu. Ou à minha falta de vocação para mulher de malandro, daquelas que saem engravidando em seqüência.

Este episódio demonstrou-me que eu, com a minha coragem, sou páreo para qualquer desafio. Mesmo que num primeiro momento tal pareça fisicamente impossível. E de como era delicioso o gosto de ser respeitada, e até temida, pelos demais.

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