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terça-feira, 18 de junho de 2013

De Jarson Brenner


Nunca estive na presença física de Jarson Brenner Borges Passos. Contudo, sinto como se o conhecesse mais do que a muitos amigos pessoais.

Jarson Brenner é meu amigo, de muitos anos. Nosso primeiro contato foi na comunidade do Orkut "Perguntas Cristãs Complexas", creio que no ano de 2006.

Jarson era cristão evangélico. Porém, se destacava por sua mente aberta, questionadora, polivalente. Diferentemente dos demais evangélicos, com a cabeça desesperadoramente fechada, Jarson falava sobre tudo sem maldade, sem segundas intenções. Por algum motivo até hoje alheio ao meu conhecimento, foi construindo uma certa "admiração" por mim, sem que eu até hoje tenha descoberto o porquê.

Quando a situação na PCCplex ficou insustentável, um grupo de membros dissidentes fundou uma nova comunidade, a "Religião & Vida", tema explorado neste outro texto: "De Orlando Nunes" http://inadvertidamente.blogspot.com.br/2013/04/de-orlando-nunes.html 

Jarson rapidamente aderiu à nova iniciativa, com entusiasmo, chegando a moderador antes da comunidade ser criminosamente deletada. Tb era membro bastante ativo da minha "Perguntas Cristãs Ridículas", e a ele teria repassado a moderação dela, se pudesse...

Com o passar dos anos, Jarson foi conquistando minha amizade e minha confiança. As comunidades eram criadas, deletadas, recicladas, abandonadas, mas ele continuava a ser presença constante em meus scraps, e-mails e mensagens. 

Jarson sempre se identificou como um "peregrino": alguém que está num caminho sagrado de descoberta pessoal, espiritual. Sempre primou pela humildade, calma, paciência, ponderação: marcas de uma pessoa verdadeiramente sábia. 

Mais sábio que aquele que aponta, indica ou inventa "caminhos" é aquele que diz "estou num caminho cujo destino não conheço, meu trajeto vai sendo descoberto ao longo da trilha". E assim é Jarson Brenner. Flerta com o Cristianismo, o Noachidismo, o Judaísmo, o Budismo, o Hinduísmo, sempre aberto a todas as formas de sabedoria, que mesmo parciais, podem sim, trazer cada uma sua contribuição à sua evolução espiritual.

Jarson é leitor assíduo desse blog, sempre deixando comentários construtivos. Sinto que eu mesma não visite o seu com tanta freqüência, e o deveria, pois são belos os seus textos e reflexões. http://www.jarsonbrenner.com.br/ 

Recentemente, tive uma grande decepção com um de meus mais íntimos amigos pessoais. Depois disso entrei numa certa "crise de identidade", me questionando quem realmente era "meu amigo de verdade" e nesse meio tempo, percebi o quanto cada curtida, comentário e mensagem de Jarson demonstravam que nele eu tinha um "grande amigo de verdade", que "me curtia" simplesmente por gostar das minhas idéias e escritos.

Assim o remanejei mentalmente do grupo dos "conhecidos virtuais" para o de "bons amigos pessoais", mesmo que nunca o tenha encontrado pessoalmente. Tantos anos de amizade, de demonstrações de boa índole, dedicação e atenção mereciam algum tipo de "reconhecimento".

Nesse meio tempo Jarson, para minha grande alegria, passou no vestibular e entrou no curso de História da UFPR. Do Maranhão, agora estava em Curitiba. Então vi que havia muito que eu poderia fazer por ele.

Imediatamente ponderei que podia ajudá-lo nessa nova trajetória. Sendo alguns anos mais velha que ele, tendo morado na maior megalópole do Brasil e já formada em História, eu poderia lhe mandar algo de minhas experiências e conhecimento.

Percebi que eram muitas as músicas que eu tinha em mp3 no meu computador que Jarson provavelmente nunca tinha ouvido. E conhecer esse "cancioneiro hipster" lhe seria cobrado no "ambiente acadêmico". Organizei todas as minhas músicas e as gravei em DVD's, divididas por categorias. Tb lhe copiei dois jogos muito interessantes para qualquer historiador: Caesar III e Civilization II. Pena que já são algo "velhos" e os novos computadores não os rodem... :(

Igualmente, eram centenas os meus arquivos de faculdade, que nunca mais usarei, e que poderiam lhe ser de grande ajuda. Os gravei, todos, tb em discos. Da mesma fiz com todos os .txt , .doc e .rtf de meus comentários e tópicos que guardei das postagens que fiz nas comunidades de perguntas religiosas das quais já participei. Por saber de seu interesse por Judaísmo, tb lhe remeti uma cópia do meu volume comentado e sublinhado do Mishnê Torá de Maimônides. Por já estar esgotado e saber de sua importância, tb lhe mandei uma cópia do "História social da Criança e da Família" do Ariès.

Por ele morar agora em Curitiba, um lugar frio, tb lhe fiz um mimo especial, e personalizado, que apenas poucos amigos chegados recebem: um cachecol, com suas iniciais. Cada cachecol que faço é exclusivo, artesanal, feito com muito carinho e cuidado. Em cada ponto vai um pensamento, um sentimento, uma meditação. E Jarson mais do que fez por merecer o seu.

Empacotei tudo e lhe remeti pelo correio. Um presente espontâneo, em reconhecimento a tantos anos de uma bela, e construtiva, amizade. Espero que o cachecol o aqueça, o proteja, o deixe elegante e charmoso. Espero que os arquivos de textos possam lhe ser úteis. Espero que ele goste das músicas, e que elas ajudem a ampliar seu horizonte cultural. Espero que ele leia os livros, e que isso contribua algo em sua evolução espiritual.

Mas, em se tratando de Jarson Brenner, sei que não me decepcionarei em nenhuma dessas expectativas. Acredito muito que no futuro ele venha a construir "renome" e que um dia, com muito orgulho, comentarei que sou amiga do famoso escritor, intelectual, historiador Jarson Brenner para assombro dos que ouvirem.

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sábado, 20 de abril de 2013

De Orlando Nunes

Nunca estive na presença de Orlando Nunes José, nem sei se este é seu nome de "pessoa física". Caso ele chegue a este texto e queira que seu nome seja suprimido, trocado pelas iniciais, basta deixar um comentário.

O conheci em 2005, na comunidade Perguntas Cristãs Complexas. Era uma comunidade do Orkut de debates religiosos que se distinguia por sua proposta democrática, variedade de participantes, pluralidade e pelo elevado nível dos debates. Mais do que tudo, era um espaço único, no qual pessoas de diferentes credos podiam interagir, comparar seus dogmas, ver os pontos fracos e fortes de cada vertente teológica.

Os debates eram muito variados. Desde temas do "dia a dia" como sexo, vestuário, alimentação, comportamento e política, até pequenas abstrações filosóficas impalpáveis, mas teologicamente essenciais.

Nessa época eu me classificava como "espírita kardecista". Ainda o digo quando perguntada por alunos. Foi no período de amadurecimento teológico durante o qual participei desta comunidade que me descobri Noachide. Na comunidade, ao assim começar a me dizer, os membros entendiam a o que eu me referia. Seu eu me declarar "filha de Noé" aos meus alunos, seria muito difícil fazê-los entender do que tal se trata. E o Noachidismo pode nem ser considerado uma "religião", mas uma derivação do Judaísmo.

Orlando Nunes era calvinista. Protestante histórico seguidor de João Calvino, o célebre reformador franco-suíço. Se destacava por ser, ou aparentar ser, uma pessoa madura, equilibrada, pluralista, e de profundo conhecimento teológico. Por sua postura sempre ilibada, todos os membros lhe dedicavam o mais alto respeito, eu inclusa. Até o admirava por sua seriedade e simpatia.

Ainda na PCComplexas tivemos alguns debates memoráveis. Um ponto que exploramos até a exaustão foi se, ao ser suspenso no madeiro (a cruz) o corpo de Jesus se tornou maldito, conforme:

Deuteronômio 21:
22 Se um homem sentenciado à pena de morte, for executado e suspenso a uma árvore, 23 seu cadáver não poderá permanecer na árvore durante a noite. Você deverá sepultá-lo no mesmo dia, pois quem é suspenso torna-se um maldito de HaShem. Desse modo, você não tornará impuro o solo que o eterno seu D'us lhe dará como herança.

Gálatas 3:
13 Cristo nos resgatou da maldição da Lei, tornando-se ele próprio maldição por nós, como diz a Escritura: «Maldito seja todo aquele que for suspenso no madeiro.»

Orlando simplesmente não podia conceber a idéia de seu deus e messias ter se tornado maldito ao morrer. E, tecnicamente, Jesus foi suspenso num madeiro ao ser crucificado, tornando-se, assim "maldito" de acordo com as Escrituras, o que para ele era uma interpretação herética. Podia ser blasfema para ele, mas essa acepção tem amplo respaldo, com duplo testemunho, na Bíblia que ele próprio considerava sagrada. Também debatemos, provavelmente por meses, a questão do livre arbítrio, que os calvinistas negam existir, e que é fundamental para 90% das outras vertentes cristãs.

Debatíamos, discordávamos, refutávamos um ao outro. E ambos tirávamos grande prazer disso. Tudo ia muito bem até que o "clima político" da PCCplex foi pesando por diversas efemérides, mas especialmente por a proposta de "Democracia plena" não se concretizar, e algumas atitudes questionáveis do grupo de moderadores.

A coisa foi crescendo a um ponto que muitos dos membros "chave" pensavam em debandar em protesto. Nesta circunstância, Orlando Nunes me mandou um e-mail com uma proposta muito interessante: a de fundarmos nosso próprio espaço, convidando os dissidentes, uma nova comunidade de Perguntas Cristãs, essa sim democrática, aberta, plural e transparente.

Incluímos nesta troca de e-mails tb ao grande amigo que fizemos na PCX Alex "Aleph" de Paula, cristão evangélico neopentecostal da Assembléia de Deus. E Aleph prontamente aderiu ao projeto. Detalhe bastante significativo é que tanto Orlando Nunes como Aleph são pastores evangélicos certificados, ainda que não o exerçam. E ambos me viam em nível de igualdade com eles para dar início a um projeto, para nós, tão importante. Nem posso dizer como me senti honrada, em minha pequenez cheia de defeitos, de que pessoas com tão alto prestígio no "meio religioso" tanto virtual como físico, me vendo como "no mesmo nível" deles!

Tb convidamos para ser membro fundador conosco ao biólogo, naturista, defensor dos Direitos Humanos, budista e jedi Arthur "Dogbert" Golgo Lucas, mas por uma série de desencontros virtuais, ele se tornou membro, mas não com tanta participação.

Nas conversas por e-mail entre mim, Orlando Nunes e Aleph foi decidido que "reciclaríamos" uma comunidade quase inativa do Orlando Nunes, a "Cristianismo Puro e Simples", a rebatizaríamos de "Religião & Vida", promulgaríamos regras democráticas (a parte de criar esta legislação ficou, com muito gosto, na minha responsabilidade), convidaríamos os membros da PCC-plex e de outras comunidades de debate religioso, fazendo da nossa comunidade o que a PCComplexas deveria ter sido.

No começo, foi tudo muito bem. A comunidade bombou. Muitos membros de outras comunidades além da PCComplexas aderiram e participavam ativamente da nossa. Nessa época, eu já trabalhava, e não podia mais, como antes, dar longos plantões nos debates de que tanto gostava. Mas diversos tópicos interessantes pululavam em comentários. Rapidamente a comunidade ultrapassou mil membros. Até moderadores que haviam motivado nossa saída da PCX "faziam as honras" de ir até nossa comunidade para debater conosco. Na nossa comunidade, as regras que eu elaborara e colocara em votação protegiam a liberdade de expressão de todos muito melhor que as regras da PCX que nos haviam feito sair de lá.

Ainda nessa época em que tudo eram flores, eu estive em São Paulo, e conversei com o Orlando para nos encontrarmos pessoalmente. Falei com ele ao telefone, combinamos de finalmente nos conhecer no Conjunto Nacional, na esquina da Avenida Paulista com a rua Augusta. Perto da hora acertada fui a um Cyber Café, só para "dar um tempo" e vi uma mensagem sua com alguma desculpa ou justificativa de que ele não poderia ir. Isso deveria ter levantado um sinal de alerta, mas não o percebi. O coloquei na conta dos "bolos comuns" que as pessoas nos dão por conta de algum "imprevisto", e não mais me preocupei a respeito. Deveria.

Tudo continuou a ir muito bem na comunidade... Até que... Começaram a surgir os problemas. Orlando começou a demonstrar incômodo com o teor e o rumo "liberal", "blasfemo" ou "não edificante" (no seu ver) dos debates. Começou a criticar os demais moderadores e a querer "mandar mais" que eu e o Aleph. Com nossos protestos, Orlando tirou da manga o trunfo que jamais pensei que tinha guardado: que ele era o "dono" anterior da comunidade, portanto, ela lhe pertencia mais do que a nós.

Debatemos isso num tópico. Sabendo que ele estava a usar um argumento falacioso, copiei e colei os trechos dos e-mails que trocamos combinando os termos da fundação da R&V. E ressaltei em negrito todas as vezes que ele colocou, por escrito, "NOSSA comunidade". E lhe disse: "se em cada vez que vc escreveu NOSSA COMUNIDADE vc tivesse escrito MINHA COMUNIDADE, eu não teria aderido ao seu projeto."

Ao invés de perceber seu erro, ele ficou "ofendidinho" por eu estar divulgando o teor dos e-mails que havíamos trocado. Logo o Aleph renunciou ao seu posto de moderador. Em solidariedade a ele e por já estar bem de saco cheio de tudo aquilo, muito frustrada e me sentindo lograda, tb renunciei, no mesmo dia. Orlando manifestou estar se sentindo traído.

Depois disso meio que "larguei mão" e não ia mais todo dia lá debater, apenas dava uma "conferida no fórum" esporádica, sem me engajar muito. Depois de um tempo, não sei bem como ou pq o próprio Orlando renunciou a prosseguir moderando "nosso/seu" grupo, repassando-o a outros moderadores. Por vários meses assim ficou a comunidade.

Até que... Sumiu!

Demorou para cair a ficha. Por algumas semanas, eu entrava no Orkut, acessava o link dos favoritos da R&V e ele simplesmente não abria. Eu tinha certeza que era algum erro temporário até que entrei em contato com Jarson Brenner e ele me disse o que havia acontecido. Inadvertidamente Orlando Nunes havia, não sei tecnicamente como, reativado sua condição de "dono" da R&V e simplesmente a DELETADO. Sem explicação, sem justificativa, sem saída, sem registro. Por debaixo dos panos, ele havia desaparecido sumariamente com uma comunidade muito ativa, deixando órfãos, perdidos e desnorteados seus mais de mil membros. Que nome se dá a isso?

Me falaram que o Orlando provavelmente tencionava se tornar um "líder religioso" e fazer da R&V "sua congregação virtual ", na qual ele arregimentaria adeptos para sua visão teológica. E quando viu falhar o projeto de fazer dessa comunidade seu "trampolim" para construir um bom nome no meio religioso, decidiu, sumariamente, deletá-la, sem nenhum respeito aos membros ativos e aos membros fundadores, que tantas horas e tanta dedicação haviam destinado a esta comunidade virtual.

Nem sei se consigo adjetivar de forma justa este ato, nem como ele me surpreendeu da pior forma possível. Por todos os anos de convivência com Orlando, pelo tanto que eu o respeitava e achava que o conhecia, e pelo próprio discurso que ele fizera quando da fundação da comunidade, nenhum de nós suspeitava que ele seria capaz de um ato tão baixo, tão vil. Eu não havia jamais visto nenhum "sinal de alerta" de que ele seria capaz de nos dar uma rasteira tão inesperada.

Orlando Nunes foi a pior decepção que já tive na Internet.

De certa forma, ter uma boa memória pode ser considerado uma maldição...

Lara Fabian - Love by Grace http://youtu.be/Kjqa_Csf29Q

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quarta-feira, 27 de março de 2013

O Getsêmani, o cálice e o pêndulo

Era dezembro de 2005. Eu estava prestes a completar 23 anos, em meu penúltimo ano de faculdade. Recentemente eu descobrira um novo prazer intelectual: debater Teologia em comunidades virtuais. A mais agitada no Brasil à época era o Orkut. E eu era uma orkuteira de primeira!

Eu já lera boa parte da Bíblia, já concluíra diversas disciplinas de cultura e história judaicas na Letras da USP. Queria interagir com outras pessoas interessadas nestes mesmos assuntos. Queria "testar hipóteses", debater, tentar levar a exegese aos seus limites. Pesquisei por "perguntas cristãs" (à época eu me considerava cristã, hj sei que nunca fui) e o primeiro resultado, de uma comunidade à época com 30 mil membros, foi a "Perguntas Cristãs Complicadas".

Interessante. Entrei. Logo percebi que aquela era uma comunidade confessional direcionada a cristãos evangélicos. E que eles passavam boa parte do tempo tentando debater com diversos malabarismos de copiar e colar, enxertando Cântico dos Cânticos no meio da Torah, com umas pitadas de profetas, tudo temperado pelo Apocalipse. Uma salada mista, pra quem vinha da Academia e procurava debates refinados. E grande parte destes malabarismos era para tentar decidir qual dentre as milhares de vertentes evangélicas é a "única e verdadeira". Também apreciavam bastante menosprezar a Igreja Católica, como se o Papa fosse o anti-Cristo, e desrespeitar a Maria de Nazaré de todas as formas possíveis.

Logo ao começar a apresentar perguntas e oferecer respostas, percebi que minhas posições afrontavam diretamente as interpretações religiosas deles. E não apenas eu percebia esse mal-estar. Diversos outros membros "se estranhavam" com o moderador Shaylon, que sumariamente expulsava as pessoas que ele achava que não estavam lá para "edificar a fé". Devido às suas ações intransigentes, outros membros que estavam lá há mais tempo resolveram debandar e criar sua própria comunidade dissidente: a Perguntas Cristãs Complexas.

Recebi um scrap de Leandro Moreira com um convite, e migrei. Na PCComplexas a proposta era de um ambiente democrático, com moderadores eleitos pela comunidade, e com plena liberdade de expressão. Era uma comunidade muito ativa e diversa: com ateus, budistas, espíritas, evangélicos de todas as vertentes imagináveis, católicos e outros tipos de protestantes, inclusive os tais dos "judeus messiânicos". Tínhamos até um seguidor de Inri Cristo. Não era piada, o Unamundo era uma pessoa racional e esclarecida, que defendia que Inri Cristo de fato era uma reencarnação de Jesus.

Logo os tópicos pegaram fogo. A participação era tanta, que eu chegava a meio que "dar plantão" nos finais de semana, finalmente debatendo cada pequeno meandro do texto bíblico, com pessoas das mais diferentes formações, para meu grande deleite intelectual. Um tópico em especial foi um hit instantâneo, com o tema: "sexo antes do casamento é pecado mesmo? Onde isso está escrito?"

Um prato cheio pra mim, que sempre gostei de "esgarçar" as interpretações da Torah até o limite máximo de sua liberalidade. Construi uma argumentação amparada em diversas passagens, mas sobretudo nesta:

Ex:22
15 Se alguém seduzir uma virgem solteira e se deitar com ela, pagará o dote e se casará com ela. 16 Se o pai dela não quiser dá-la, o sedutor pagará em dinheiro, conforme o dote das virgens.

Essa passagem diz: se uma moça se entregar de boa vontade "seduzida" por seu namorado, não há obrigatoriedade de casamento, apenas uma indicação. Se o pai não concordar com o casamento, ele não se realizará. O pai deve ser indenizado por ter "sua propriedade avariada". Fora a "multa", NENHUMA punição é prescrita a nenhum dos enamorados, e não é dito que eles estejam a partir daí proibidos de contrair matrimônio com terceiros.

Há mais uma dezena de outras passagens bíblicas que me autorizam a defender que, pela Torah, essa "neurose" cristã com a virgindade não tem respaldo legal. Debate vai, debate vem, um membro em especial, Sílvio, que era mórmon, se demonstrava revoltado com, na sua forma de pensar, eu estar a "estimular a promiscuidade" e de eu estar usando a própria Bíblia para isso.

Ao longo de uns 400 comentários o debate foi cada vez pegando mais fogo até que... Até que certo dia o tal Sílvio foi ao perfil moderacional e deixou 2 ou 3 scraps lá reclamando de a comunidade dar espaço para, nas suas palavras textuais, "uma garota de programa enrustida".

Imediatamente o moderador Marcel Vasconcelos excluiu o membro, fez um screenshot e deletou os scraps. No dia seguinte a comunidade estava em polvorosa, sem que os membros soubessem exatamente o que tinha acontecido, e os amigos do Sílvio questionando sua retirada. A moderação da PCCplex explicou a todos que o conteúdo da postagem que resultara na expulsão do Sílvio era altamente ofensivo, e portanto não seria posto à vista de todos.

Me mandaram uma cópia do screenshot e ao ler que eu havia sido chamada de "garota de programa" (pra quem não sabe, isso se refere às prostitutas) meu sangue imediatamente gelou nas veias, e me senti profundamente ultrajada. Eu jamais tinha imaginado que por passar minhas noites e finais de semana pendurada na internet debatendo Teologia eu poderia ser acusada de fazer sexo a dinheiro.

Pois, obviamente, se eu fizesse sexo a dinheiro, primeiro que não debateria Teologia, segundo que se eu fosse deste métier, nas noites e feriados eu estaria ocupada demais para ficar em casa madrugadas a fio debatendo pequenos detalhes da Lei de Moisés. Então a pessoa que me ofendeu, e se dizia um mórmon muito dedicado à sua religião, sabia a princípio que estava levantando falso testemunho contra mim, o que sim é pecado claramente expresso no Decálogo (Cf. Ex 20:16).

Mas o Sílvio prosseguiu a reclamar, e a incitar os membros que lhe eram próximos contra a moderação da PCX. A Moderação então franqueou que ele nomeasse um "advogado", um membro da comunidade no qual ele confiasse para o representar. Ele escolheu Orlando Nunes José, que à época era amplamente respeitado por todos, até por mim (posteriormente ele se revelou uma das maiores decepções que eu já tive na Internet, mas isso fica para outro texto).

Mandaram a Orlando Nunes o screenshot. E, sabiamente, ele deu razão à Moderação. Concordou que a expulsão do Sílvio era sim justa. Mesmo tendo sido nomeado por Sílvio como defensor, não havia como ele defender seu amigo diante da forma como este me ofendera. Sílvio engoliu o sapo e não mais nos incomodou por alguns meses.

Tempos depois, ele pediu para voltar, e a Moderação me consultou. Minha posição foi: que ele volte, mas que se desculpe publicamente pelo que fez. Se a ofensa foi pública, igualmente deveria ser a retratação. E ele o fez, criou um tópico chamado "O Getsêmani, o cálice e o pêndulo", no qual se mortificava pelo que havia feito. Li, não me convenci de sua sinceridade, mas me dei por satisfeita. Posteriormente até cheguei a voltar a debater com ele outras questões.

Depois de muito tempo, sanadas todas as feridas, hoje este episódio me traz um certo "orgulho", como o que um soldado sente a respeito de suas cicatrizes de guerra. Foi algo, completamente inesperado, que me marcou muito. Tanto pela ofensa como pela proteção que o grupo de moderadores me deu. Foram rápidos, eficientes, e agiram da melhor forma possível à época. Depois tivemos nossos entreveros sobre a não realização da proposta de "democracia plena", mas isso tb fica para outro texto.

Muitas mulheres são acusadas de ter um comportamento sexual desregrado, ofendidas como "garotas de programas" e tratadas como prostitutas, sem o ser.

Mas poucas podem dizer que passaram por isso porque gastavam todas as suas horas livres, varando madrugadas e finais de semana, a debater Teologia.

Tópico do orkut - http://www.orkut.com/Main#CommMsgs?tid=2442448414765242414&cmm=6452454&hl=pt-BR

http://pccomplexas6452454.blogspot.com.br/2006/03/o-getsemani-o-clice-e-o-pendulo-annimo.html

Depeche Mode - Personal Jesus http://youtu.be/cNd4eocq2K0
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domingo, 18 de dezembro de 2011

Uma análise das Leis bíblicas sobre sexo, casamento, divórcio e estupro

Muita comoção e indignação internacionais foram despertadas pelo caso da afegã conhecida singelamente por "Gulnaz". Aos 19 anos ela foi estuprada pelo marido de sua prima. Calou-se sobre a violência, mas não pôde escondê-la quando os sinais da gravidez resultante começaram a aparecer. De acordo com a Sharia, lei religiosa islâmica, ela foi condenada a 12 anos de prisão por praticar "sexo fora do casamento". Foi-lhe facultada a reaquisição de sua liberdade caso ela restabelecesse sua honra da única forma possível perante as leis religiosas tribais: casando-se com seu estuprador.

Uma situação absurdamente surreal: além de ter sido vítima de uma violação foi considerada, por ter sido estuprada, culpada de um crime. Cuja "retificação" consistiria em ela ser obrigada a reiteradamente realizar o ato sexual com seu algoz, submetendo-se a seu domínio matrimonial. Sua absolvição consistiria em ela tornar a fazer sexo com seu estuprador, mas agora sob a chancela da lei. Nem Salvador Dalí nem De Chirico seriam capazes de pintar um quadro com tintas tão disparatadas.

Muitos apressadamente condenarão o "atraso" das leis religiosas vigentes no Afeganistão. Não pretendo lhes tirar a devida razão, apenas dar uma perspectiva mais ampla sobre esse tema: as leis religiosas que versam sobre sexo, divórcio, estupro e relações sexuais "antes do casamento". E para essa análise partirei das Leis religiosas vistas como sagradas no Ocidente, presentes no texto-base da Cultura Judaico-cristã Ocidental: a Bíblia, considerada por cristãos e judeus a "palavra de Deus". Mais especificamente, me debruçarei sobre o Antigo Testamento (Tanach). E nele, a Lei de Moisés (Torah), também chamada de Pentateuco.


Um debate religioso que sempre dá ibope é a virtual proibição bíblica ao "sexo antes do casamento". Não existe proibição bíblica ao sexo antes do casamento simplesmente pq, biblicamente, não existe sexo antes do casamento. O sexo é o próprio casamento. O que chancela a união entre esposos é a efetivação do ato sexual entre eles. Ainda hoje, tanto pelas leis religiosas como civis, mesmo que duas pessoas casem-se perante a lei, a união reconhecida em cartório só se realiza de fato na "consumação do casamento", que se dá no intercurso sexual.


Aí entra a pergunta: e se um casal faz sexo sem ser casado? É claro que a Torah legisla sobre essa situação, e a respeito dela preconiza:


Êxodo 22:

15 Se alguém seduzir uma virgem solteira e se deitar com ela, pagará o dote e se casará com ela. 16 Se o pai dela não quiser dá-la, o sedutor pagará em dinheiro, conforme o DOTE das virgens.

Essa Lei atesta claramente que "sexo antes do casamento" (entre pessoas solteiras e desimpedidas), por si só, não quebra nenhum mandamento, pois se quebrasse, haveria alguma punição ao casal pelo "pecado" cometido. E nenhuma punição é prescrita nem à jovem "seduzida" nem ao “namorado” sedutor. Apenas a multa pecuniária ao "proprietário da honra da virgem" (seu pai) e a indicação, NÃO OBRIGAÇÃO, de que o casal se una num matrimônio definitivo. Caso seja do desejo do pai da moça.


O que escapa a muitos é que na sociedade veterotestamentária não existiam pessoas "livres e desimpedidas" como hoje o concebemos. Nossa perspectiva burguesa de liberdade pessoal, auto-determinação, individualismo e a "busca da felicidade" inexistiam. As pessoas não subsistiam "sozinhas", apenas como membros de sua família estendida, sua beit'av. E especialmente as mulheres não eram donas de seu próprio corpo, destino e vontades. Mulheres, especialmente as virgens, tinham alto valor monetário. O patriarca era dono de seus filhos, senhor sobre a vida e a morte de todos sob sua autoridade clãnica. Vejamos alguns preceitos que ilustram isso:


Êxodo 21:

7 Se alguém vender a filha como escrava, esta não sairá como saem os escravos. 8 Se ela desagradar ao patrão, a quem estava destinada, este deixará que a resgatem; não poderá vendê-la a estrangeiros, usando de fraude para com ela. 9 Se o patrão destinar a escrava para seu filho, este a tratará conforme o direito das filhas. 10 Se o patrão tomar uma nova mulher, ele não privará a primeira de comida, roupa e direitos conjugais. 11 Se ele não lhe der essas três coisas, ela pode ir embora sem pagar nada.


Claramente, o pai tem direito a vender sua filha como escrava, visto que ela, ou sua virgindade, é uma propriedade com valor em dinheiro. Ao ser vendida em casamento, a filha passa a ter um "patrão", um "novo dono". Mas ainda assim persiste depositária de certos direitos, como a preservação de sua honra e possibilidade de divórcio (irrevogável). Se partir do marido a iniciativa da separação, claro.


Deuteronômio 24:

1 Quando um homem se casa com uma mulher e consuma o matrimônio, se depois ele não gostar mais dela, por ter visto nela alguma coisa inconveniente, escreva para ela um documento de divórcio e o entregue a ela, deixando-a sair de casa em liberdade. 2 Tendo saído de sua casa, se ela se casar com outro, 3 e também este se divorciar dela e lhe entregar nas mãos um documento de divórcio e a deixar ir embora em liberdade, ou se o segundo marido morrer, 4 então o primeiro marido, que se havia divorciado dela, não poderá casar-se outra vez com ela, pois estará contaminada: seria um ato abominável diante de Javé. Você não deve tornar culpada de pecado a terra que Javé seu Deus vai lhe dar como herança.


Deuteronômio 22:

13 Se um homem se casa com uma mulher e começa a detestá-la depois de ter tido relações com ela, 14 acusando-a de atos vergonhosos e difamando-a publicamente, dizendo: ‘Casei-me com esta mulher mas, quando me aproximei dela, descobri que não era virgem’, 15 o pai e a mãe da jovem pegarão a prova da virgindade dela e levarão a prova aos anciãos da cidade para que julguem o caso. 16 Então o pai da jovem dirá aos anciãos: ‘Dei minha filha como esposa a este homem, mas ele a detesta, 17 e a está acusando de atos vergonhosos, dizendo que minha filha não era virgem. Mas aqui está a prova da virgindade da minha filha!’ E estenderá o lençol diante dos anciãos da cidade. 18 Os anciãos da cidade pegarão o homem, mandarão castigá-lo 19 e o multarão em cem moedas de prata, que serão entregues ao pai da jovem, por ter sido difamada publicamente uma virgem de Israel. Além disso, ela continuará sendo mulher dele, e o marido não poderá mandá-la embora durante toda a sua vida.

20 Se a denúncia for verdadeira, isto é, se não acharem a prova da virgindade da moça, 21 levarão a jovem até à porta da casa de seu pai e os homens da cidade a apedrejarão até que morra, pois ela cometeu uma infâmia em Israel, desonrando a casa do seu pai. Desse modo, você eliminará o mal do seu meio.


Nesse excerto de Deuteronômio 22 muitos vêem que a mulher, obrigatoriamente, deve ser virgem para se casar. Isso não é verdade. O que esse texto condena é a fraude de se "vender gato por lebre": um homem se casar enganado achando que a noiva é virgem quando não é (e haver pago por um dote mediante fraude). Pq posso afirmar que não é obrigatório que a noiva seja virgem para se casar? Pq há uma Lei que determina que uma única mulher, em todo o Israel, obrigatoriamente deve ser virgem ao se casar: a esposa do Sumo Sacerdote.


Levítico 21:

10 O sumo sacerdote, escolhido entre seus irmãos, sobre cuja cabeça foi derramado o óleo da unção e foi consagrado com a investidura das vestes sagradas, não andará despenteado nem esfarrapado. 11 Não se aproximará de nenhum cadáver, porque não deverá tornar-se impuro, nem mesmo por seu pai ou por sua mãe; 12 não sairá do santuário e não profanará o santuário do seu Deus, porque está consagrado com o óleo da unção do seu Deus. Eu sou Javé. 13 Ele tomará por esposa uma virgem; 14 não se casará com viúva ou com mulher repudiada, desonrada ou prostituta, mas se casará com uma virgem do seu povo, 15 para não profanar seus filhos no meio do povo, porque eu sou Javé, que o santifico».


O sumo sacerdote, necessariamente um levita cohen, e apenas ele, deve obrigatoriamente escolher "uma virgem do seu povo" para se casar. Essa Lei não se aplica ao "cidadão comum" e nem aos demais sacerdotes, vejamos:


Levítico 21:

1 Javé falou a Moisés: «Diga aos sacerdotes, filhos de Aarão: O sacerdote não se contaminará com o cadáver de um parente, 2 a não ser que se trate de parente muito chegado: mãe, pai, filho, filha, irmão. 3 Também por sua irmã solteira que vive com ele; por causa dela poderá expor-se à impureza. (...)

7 Não se casarão com prostituta ou mulher desonrada, ou ainda mulher que tenha sido repudiada por seu marido, porque o sacerdote está consagrado ao seu Deus.


Claramente compreendemos que enquanto o "sacerdote comum" não pode se casar com uma ex-prostituta, ou desonrada, ou repudiada, ao sumo sacerdote, e apenas a ele, além dessas interdições, é acrescida a necessidade da virgindade da noiva. Subjaz o raciocínio: e o "cidadão comum", pode ser casar com uma mulher solteira ex-prostituta, desonrada, repudiada ou que não seja mais virgem? Com certeza. Se ela não for sua parente nem sua ex-mulher (havendo se casado com outro, mesmo que seja viúva).


Caso uma moça que perdeu a virgindade ficasse proibida de se casar, seguramente o versículo de Ex 22:16 "Se o pai dela não quiser dá-la, o sedutor pagará em dinheiro, conforme o dote das virgens" seria acrescido do apêndice: "e não poderá mais ser dada em casamento", ou "e estará contaminada para sempre", ou "e ficará na casa de seu pai pelo resto de seus dias" ou um simples "e não poderá mais ser dada em casamento a outro".


Mas nada disso, e nada nesse sentido, está escrito ou pode sequer ser derivado a partir de outras passagens. Peço encarecidamente a todos os leitores que encontrem qualquer determinação nesse sentido que a compartilhem aqui. Ficarei muito grata pois meu propósito não é desviar ninguém do correto cumprimento da Lei. Meu objetivo é esclarecer preceitos interpretados parcial ou erroneamente. E renovar, sob uma perspectiva histórica e modernizante, qual é o verdadeiro propósito do Criador ao nos legar as instruções (mitzvot) da Torah.


É necessário dizer que na cultura bíblica não existe a figura da "mulher independente". Na sociedade hebraica da Antiguidade toda mulher estava submetida a uma autoridade masculina. Sendo solteira, seu pai. Sendo casada, seu marido. Tanto que a palavra, e qualquer compromisso assumido, por uma mulher não vale nada até que seja chancelado pela autoridade a que está submetida. Vejamos:


Números 30:

2 Moisés falou aos chefes das tribos de Israel: «Assim ordena Javé: 3 Quando um homem fizer um voto a Javé ou se comprometer com alguma coisa sob juramento, não deverá faltar à palavra. Cumpra o que prometeu.

4 Quando uma mulher, ainda solteira e morando com o pai, fizer um voto ou se obrigar a uma promessa, 5 se o pai, conhecendo o voto ou a promessa que ela fez, nada lhe disser, então os votos dela são válidos e a promessa ficará de pé. 6 Contudo, se o pai, no dia em que tomou conhecimento, fez oposição à promessa, nenhum dos votos e promessas que ela fez serão válidos. Javé a dispensa, porque o pai dela desaprovou.

7 Se ela se casar comprometida pelo voto ou pela promessa que fez sem pensar, 8 e se o marido, ao tomar conhecimento, nada lhe disser no dia em que for informado, os votos e promessas que ela fez serão válidos. 9 Contudo, no dia em que o marido tomar conhecimento, se ele fizer oposição, o voto que ela fez ficará nulo, e a promessa que fez sem pensar não terá efeito. Javé os dispensará.

10 O voto de uma viúva ou repudiada e todas as promessas que fizer serão válidos.

11 Quando uma mulher faz um voto na casa do seu marido, ou se compromete com alguma coisa sob juramento, 12 se o marido, ao saber do fato, nada lhe diz e não lhe faz oposição, então os votos dela são válidos e a promessa que fez ficará de pé. 13 Contudo, se o marido, ao ser informado, os anula, então os votos e promessas dela ficam inválidos. Seu marido os desaprovou e Javé a dispensa.

14 O marido pode confirmar ou anular qualquer voto ou juramento de penitência feito pela sua mulher. 15 Contudo, se o marido nada lhe diz até o dia seguinte, então confirma todos os votos e promessas que a obrigam: ele os confirma com o silêncio que guardou ao ser informado. 16 Todavia, se foi informado e os anula mais tarde, ele próprio levará o peso da culpa de sua mulher».


Apenas o voto de uma mulher "desobrigada", viúva ou repudiada (divorciada), é válido sem a chancela de uma autoridade masculina. Daí podemos derivar que nenhuma mulher "solteira" (que ainda vive na casa paterna) é livre e dona de si. Enquanto solteira ela pertence a seu pai. Enquanto casada pertence a seu marido. E deve ser dito, que pela lei do levirato, caso ela não tenha dado ao menos um filho ao falecido marido, deverá se casar com o cunhado (Dt 25:5-10).


Portanto, pela perspectiva bíblica, o único jeito de uma mulher ganhar o que poderíamos chamar de liberdade e "autoridade sobre si e sua própria palavra" é submeter-se à determinação do casamento paterno, e posteriormente ver-se livre do marido e das obrigações que deve à família deste. Após isso o pai não poderá revendê-la uma segunda vez "usando de fraude para com ela" e seu futuro marido, repassando-a a um terceiro como se virgem fosse.


Essa passagem também diz, numa interpretação especular, que nenhuma moça solteira pode prometer a si mesma em casamento. Qualquer compromisso assumido por uma moça solteira deve ser aprovado por seu pai. Por isso ele não é obrigado a entregá-la em casamento mesmo que ela mesma entregue, por "amor", após ser "seduzida", sua virgindade ao parceiro de sua escolha. Biblicamente, a mulher não é dona de sua própria virgindade. Este bem, com valor em dinheiro, pertence ao seu pai. E caso ele veja avariado seu patrimônio, deve receber como indenização o "dote das virgens", mesmo que ele não permita que sua filha se case com quem a "seduziu" e "tirou sua virgindade".


Mas o leitor pode estar se perguntando o que toda essa análise tem a ver com o caso de Gulnaz. Ocorre que a Torah também tem Leis concernentes ao estupro. E que ecoam os preceitos da sharia adotada pelos muçulmanos. Leiam com seus próprios olhos:


Deuteronômio 22:

23 Se houver uma jovem prometida a um homem, e um outro tiver relações com ela na cidade, 24 vocês levarão os dois à porta da cidade e os apedrejarão até que morram: a jovem por não ter gritado por socorro na cidade, e o homem por ter violentado a mulher do seu próximo. Desse modo, você eliminará o mal do seu meio. 25 Contudo, se o homem encontrou a jovem no campo, a violentou e teve relações com ela, morrerá somente o homem que teve relações com ela; 26 não faça nada à jovem, porque ela não tem pecado que mereça a morte. É como o caso do homem que ataca seu próximo e o mata: 27 ele a encontrou no campo e a jovem pode ter gritado, mas não havia quem a socorresse.

28 Se um homem encontra uma jovem que não está prometida em casamento e a agarra e tem relações com ela e é pego em flagrante, 29 o homem que teve relações com ela dará ao pai da jovem cinqüenta moedas de prata, e ela ficará sendo sua mulher. Uma vez que a violentou, não poderá mandá-la embora durante toda a sua vida.


Nisso deve ser apontado um princípio muito claro: uma mulher casada ou noiva que é estuprada apenas se livra da condenação à morte por adultério caso ela tenha sido violada "no campo", fora dos muros da cidade; pois ela "pode ter gritado". Se a violação se deu na cidade, ela deve ser apedrejada até a morte como adúltera. O leitor moderno nisso lerá um absurdo insensato. E o é, em nossa sociedade moderna, cujas casas contam com algum nível de isolamento acústico. Não em vilarejos da Antiguidade, com tendas de pele e casas construídas com barro no método do pau-a-pique. O conceito de "privacidade" nasceu com o aburguesamento das interações sociais, e recintos domésticos, que só se deu no século XIX. Até então o conceito de "invasão de privacidade" inexistia pois a própria privacidade individual era inexistente. Caso uma mulher gritasse, toda a vila seguramente a ouviria.


Podemos nos perguntar pq a moça que se entregou voluntariamente em Dt 22:16 não é obrigada a contrair matrimônio enquanto a jovem violada em Dt 22:29 é obrigada a se casar com seu algoz. A diferença entre essas passagens é o "pego em flagrante", a exposição pública da violação, que desonra abertamente à mulher e à sua família diante de toda a comunidade. Após tal vexame nenhum outro homem se disporia a casar-se com ela e por isso quem "a violentou, não poderá mandá-la embora".


Por essa passagem é com pesar que devo reconhecer: para fins de estupro, os mandamentos bíblicos não diferem em nada da sharia. Se nossa sociedade ocidental fosse julgar o caso de Gulnaz por suas próprias leis religiosas, ela seria igualmente obrigada a desposar seu estuprador para "limpar sua honra". Isso estabelecido, torna necessária uma ampliação de nossa visão sobre "as leis do outros" e uma mudança de perspectiva sobre a forma como analisamos os textos que consideramos sagrados em nossa própria religião.


O profeta Muhammad (abençoado seja seu nome, e de todos os que pregaram contra a idolatria) bebeu na fonte da Torah para elaborar a religião muçulmana e sob muitos aspectos do direito feminino a sharia pode ser considerada "mais avançada" do que nas Leis de Moisés. Por exemplo, pela Lei mosaica as filhas não têm direito à herança paterna. Pelas leis corãnicas elas têm, uma porção menor que a dos irmãos homens, mas ainda são titulares de alguns direitos patrimoniais na casa de seu pai. Deve ser acrescido que detalhe fundamental na biografia do fundador do Islã é seu primeiro casamento com Khadija, mulher mais velha, viúva, rica, e dona de si. Seguramente este fator influenciou determinantemente, de forma positiva, a construção da imagem feminina na religião islâmica.


Na Torah há apenas um caso de jovem solteira estuprada: Dina, única filha de Jacó / Israel citada pelo nome, ou da qual se tem notícia. E é uma referência melancólica.


Gênesis 34:

1 Dina, filha de Lia e Jacó, saiu para ver as mulheres do país. 2 Siquém, o filho do heveu Hemor, príncipe do país, tendo-a visto, tomou-a, dormiu com ela e a violentou. 3 Contudo, sentiu-se atraído por Dina, filha de Jacó, apaixonou-se por ela e procurou cativá-la. 4 Então Siquém falou a seu pai Hemor: «Consegue-me essa jovem para ser minha mulher». 5 Jacó soube que Siquém tinha desonrado sua filha Dina; mas, como seus filhos estavam no campo com o rebanho, esperou em silêncio até que eles voltassem.

6 Hemor, pai de Siquém, foi falar com Jacó. 7 Quando os filhos de Jacó voltaram do campo e souberam da notícia, ficaram indignados e furiosos, pois era uma infâmia em Israel que Siquém tivesse dormido com a filha de Jacó, coisa que não se faz. 8 Hemor falou com eles: «Meu filho Siquém se apaixonou pela filha de vocês. Peço que vocês a dêem para ele como esposa. (...)

25 No terceiro dia, quando os homens estavam convalescendo, Simeão e Levi, filhos de Jacó e irmãos de Dina, tomaram cada um a sua espada, entraram sem oposição na cidade e mataram todos os homens. 26 Passaram a fio de espada Hemor e seu filho Siquém, tomaram Dina da casa de Siquém, e partiram. 27 Os filhos de Jacó atacaram os feridos e pilharam a cidade, porque haviam desonrado sua irmã. 28 E deles pegaram as ovelhas, bois e jumentos, tudo o que havia na cidade e no campo. 29 Roubaram-lhes todos os bens, todas as crianças, e pilharam o que havia nas casas.

30 Jacó disse a Simeão e Levi: «Vocês me arruinaram, tornando-me odioso para os cananeus e ferezeus que habitam o país. Somos poucos: se eles se reunirem e nos atacarem, me matarão e acabarão comigo e com minha família». 31 Mas eles responderam: «Por acaso nossa irmã pode ser tratada como uma prostituta?»


Essa é a última passagem que cita Dina. Ela simplesmente desaparece dos relatos bíblicos depois disso. Isso demonstra numa primeira análise o seguinte: não existe mulher judia sem honra. A mulher judia que é "desonrada" (ao perder sua virgindade, mesmo que por estupro) "some", "desaparece", "deixa de existir", torna-se "invisível".


Numa segunda leitura percebemos como essa passagem se liga a Dt 22:25. Em ambas as situações a jovem tinha "saído de casa" sem a tutela de seu guardião. E nisso a Torah desaconselha o livre "ir e vir" feminino. Hoje isso pode parecer absurdo. E é. Em nossa sociedade moderna. Porém mais uma vez devemos fugir ao anacronismo e analisar a Lei munidos da perspectiva histórica.


Hoje a mulher é vista como tão depositária de "direitos" e "dignidade" quanto os homens. Não no "Antigo Testamento", no qual as mulheres são pouco mais que escravas. Enquanto solteiras pertencem a seu pai; após casadas a seu marido.


Atualmente, caso um homem veja uma mulher solteira livremente andando por aí e deseje fazer sexo com ela, ele se sentirá socialmente obrigado a cortejá-la, a convencê-la “pela lábia” a aquiescer, por livre vontade. E só fará sexo com ela caso ela aceda positivamente às suas investidas. Há 3 mil anos os valores morais e a etiqueta dos relacionamentos eram muito diferentes. Caso um homem encontrasse uma mulher "dando sopa por aí", não teria escrúpulos em violá-la, tomá-la para si, subjugá-la usando de violência. Tanto quanto se ele visse uma cabra ou vaca, sem dono, "dando sopa por aí" não titubearia em dizer "achado não é roubado" e agregar o animal ao seu plantel. Embora isso seja claramente proibido. Por isso as mulheres eram resguardadas, mantidas em confinamento no ambiente doméstico, e ocultadas por véus ao se exporem publicamente.


Pergunta final: e o que a Torah tem a dizer sobre a mulher solteira que não vive mais na casa paterna nem é mais sustentada por ele, mas que se provém por meios próprios?


A resposta é cristalinamente simples: nada. Na perspectiva bíblica é impensável a existência de uma "mulher independente" que se sustenta e é dona de si. Porém, como a Torah é perfeita, podemos inferir princípios que limitam a interferência paterna na vida de suas filhas. Cada palavra da Lei foi milimetricamente calculada e posicionada, nenhum caractere está lá sem motivo, gratuitamente. De cada Lei devemos extrair não apenas o que está explicitado em letras negras, mas também o que não está escrito, o que é calado, nas partes em branco. A isso, o ler o negativo da Bíblia, chamo de análise especular, por espelho. Cada Lei que diz uma coisa também afirma uma série de outras coisas, sobre as quais se cala. E isso está expresso na conclusão da passagem sobre a chancela masculina aos compromissos assumidos por uma mulher:


Números 30:

17 São essas as ordens que Javé deu a Moisés para o marido e a mulher, e para o pai e a filha, quando esta ainda vive com seu pai.


A expressão-chave aí é: "quando esta ainda vive com seu pai". Caso uma moça solteira que não resida na casa paterna ainda devesse satisfações para seu genitor a parte "quando esta ainda vive com seu pai" simplesmente inexistiria e não haveria como eu afirmar que a Lei nada diz sobre mulheres que moram sozinhas. A Lei fala sobre elas (calando-se a seu respeito) ao especificar que apenas quem ainda está sob a tutela e sustento paterno permanece submetida a sua autoridade.


À guisa de conclusão: devemos analisar muito criteriosamente nossas próprias leis religiosas, que o Ocidente acatou com o sua base moral, antes de nos arrogarmos o direito de considerar "atrasadas" as leis "dos outros". A Lei Judaica é um manancial riquíssimo de significados que podem ser lidos de múltiplas formas, caleidoscópicas, e que muitas vezes dizem uma coisa esclarecendo outras. Muitas lições estão escondidas de forma quase subliminar.


Devemos ter muito cuidado e respeito ao manejar e interpretar a Lei. Tão errado quanto violar um preceito da Torah é, pretensiosamente, adicionar a ela mandamentos que não existem.


Dt 28: 14 Não se desvie para a direita nem para a esquerda, em tudo o que eu hoje lhes ordeno, indo atrás de outros deuses para servi-los.


Dt 4:

2 Não acrescentem nada ao que eu lhes ordeno, nem retirem coisa nenhuma. Observem os mandamentos de Javé seu Deus do modo como eu lhes ordeno.


Nina Simone - Ain't got no... I got life


Alanis Morissette - Princes Familiar


Joss Stone - Super Duper Love / Digging on me

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Salgadinho de bacon é kasher?

Há muito tempo atrás, numa galáxia muito distante, eu era moderadora de uma comunidade do Orkut chamada "Perguntas Cristãs Ridículas". Muitos consideravam que a comunidade se destinava a ridicularizar o Cristianismo, mas muito pelo contrário, seu objetivo era esclarecer dúvidas teológicas populares reais e pertinentes, mas que num primeiro momento pareciam "risíveis" ou "ridículas".

A muitos escapa que mesmo as dúvidas religiosas mais tresloucadas e descabidas trazem subjacentes importantes e necessários esclarecimentos sobre religião. E o mais curioso é que a primeira, e mais fácil resposta, sempre é a errada. Teologia não é coisa para amadores, embora muitos semi-analfabetos se arroguem suma autoridade interpretativa...

O tema desta postagem pode parecer "ridículo" e ter uma resposta óbvia e fácil. Mas nada em religião é óbvio e fácil, embora muitos gostem de assim pensar. A resposta imediata, e errada, seria: "É ÓBVIO que salgadinho de bacon não é kasher, pois bacon é carne de porco, e porco não é kasher." Mas antes das respostas menos óbvias, permitam-me ser exata sobre meu questionamento.

"Kasher" ou "Kosher" em hebraico significa "adequado", se referindo aos alimentos permitidos pelas leis dietéticas judaicas. A mais conhecida interdição é a do consumo de carne de porco, porém são dezenas as demais leis.

"Salgadinho de bacon" é também chamado de Pellet, ou "baconzitos" na marca mais famosa à venda. Vejamos a descrição sucinta que a embalagem faz do produto: "Salgadinho de trigo sabor bacon. Contém aromatizante sintético idêntico ao natural". Hum... "de trigo", "aromatizante sintético" (artificial).

Vejamos os ingredientes: "farinha de trigo fortificada com ferro e ácido fólico, fécula de mandioca, óleo vegetal, preparado para salgadinho sabor idêntico ao natural de bacon (sal, farinha de arroz, açúcar, amido, maltodrexina, glucose, extrato de carne, realçador de sabor glutamato monossódico, aromatizante e corante caramelo), sal e fermento químico bicarbonato de sódio. Contém Glúten."

* Possibilidade de resposta número 1: a apressada *

Salgadinho de bacon é kasher pois "carne de porco" não está entre os ingredientes, apenas "extrato de carne", que, subentende-se, seja de bovino. Ademais, como não há leite nem derivados listados entre os ingredientes, o salgadinho não viola a interdição de ingerir conjuntamente leite e carne. Portanto, coma seu baconzitos tranquilo."

* Possibilidade de resposta número 2: a orgulhosa *

Salgadinho de bacon pode ser kasher pois "carne de porco" não está entre os ingredientes, apenas "extrato de carne". Porém é necessário verificar com o fabricante que tipo de carne é utilizada. Nesse momento a pessoa cheia de si visita o site, telefona para o SAC da Elma Chips ou mesmo vai pessoalmente à fábrica para certificar-se de que a carne usada é de boi e não de porco. Certificada disso, a resposta seria que sim, o salgadinho é kasher pois verifiquei pessoalmente que nele não entra nenhum ingrediente derivado do porco.

* Possibilidade de resposta número 3: a prudente *

Salgadinho de bacon pode ser kasher pois nele não entra nenhum ingrediente derivado do porco nem nele se mistura carne com leite. Porém, o pacote tem selo kasher? Apenas um selo kasher certifica que o produto foi fabricado dentro das leis dietética judaicas, não entrando em contato com maquinário contaminado nem contendo restos de insetos e outras coisas não kosher, sendo manipulado com toda a higiene e respeito ao cashrut. Se o pacote tem este selo, pode comer tranquilo.

* Possibilidade de resposta número 4: a zelosa *

Salgadinho de bacon pode ser kasher pois nele não entra nenhum ingrediente derivado do porco nem nele se mistura carne com leite, se o pacote for assinalado com o selo kasher. Porém, vc comprou esta embalagem numa loja judaica? Se não, como vc pode ter certeza se ela não foi transportada junto com derivados do leite, ou carne de porco? Como vc pode ter certeza se baratas e formigas não caminharam sobre ela? Ou se ela foi manipulada por uma funcionária menstruada, ou por um funcionário idólatra? Portanto, apenas se vc comprar seu baconzitos com selo kasher numa delicatessen judaica, vc poderá estar seguro de ele ser, realmente, kasher.

Alguém tem uma quinta possibilidade de resposta?

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Por que tantos presidiários se dizem "de Jesus"?

Antes de mais nada, gostaria de deixar claro que em nenhum momento pretendo insinuar que a crença cristã seja compatível ou conduza alguém à prática de crimes. Provavelmente Jesus é tão popular nos presídios brasileiros quanto Maomé é nos presídios da Indonésia e Buda nos presídios chineses. Ou seja, o fato de a opção dos brasileiros ser por Jesus é fruto de determinantes histórico-culturais.

Explicitado o alerta, vamos ao questionamento.

Não sei quantos de vcs já passaram pela experiência de estar encarcerado ou trabalhar num cárcere. Graças a Deus nunca estive presa, mas já tive oportunidade de trabalhar em duas instituições prisionais: a Fundação CASA, que interna menores infratores (antiga FEBEM), e o Centro de Ressocialização Masculino de minha cidade, com prisioneiros adultos aguardando julgamento, em regime fechado ou em semi-aberto.

Em ambas as instituições prisionais em que trabalhei era surpreendente a porcentagem de apenados que declaravam-se "de Jesus" ou genericamente "evangélicos". Aliás, o lema oficial do PCC, Primeiro Comando da Capital, organização criminosa que age dentro e fora dos presídios paulistas, é: "Fé em Deus, Paz, Justiça e Liberdade."

Tb deve ser apontado que toda instituição prisional brasileira é (ou deveria ser) aberta à atuação de conselheiros e líderes espirituais de qualquer religião, no serviço conhecido como "capelania". E que em minha experiência percebi a atuação de apenas um grupo católico e de diversos grupos evangélicos, de diversas igrejas, sendo os evangélicos mais militantes e engajados em sua "pastoral carcerária". Jamais tive notícia do interesse de qquer outra vertente religiosa em oferecer assistência espiritual ou moral aos encarcerados nos locais onde trabalhei.

Já pensei muito a respeito do porquê, enquanto 20% da população brasileira é "de Jesus", cerca de 60% de sua população carcerária declara-se da mesma forma, numa clara aberração estatística.

Algumas hipóteses que elaborei são:

a) Pura hipocrisia. Assim como fingem estar arrependidos, os criminosos fingem ter se tornado religiosos.

b) Real conversão devida ao arrependimento e à atuação dos conselheiros religiosos que trabalham nas instituições prisionais.

c) Estratégia de sobrevivência. Os demais presidiários tendem a respeitar e a não mexer com quem se diz "de Jesus".

d) Problema inerente à teologia cristã-paulina, que ao dizer que a Lei foi revogada e Jesus já pagou por todos os nossos pecados, deixa a janela aberta para a pessoa prosseguir cometendo crimes sem peso na consciência, pois somos todos pecadores.

e) Como a maior parte dos evangélicos pertence aos estratos mais pobres da população e os encarcerados pertencem, em sua maioria, a essa classe social, sendo que mais pobres ficam pesos e mais pobres são evangélicos, isso explica o fenômeno.

Pergunta Cristã Ridícula: Por que tantos presidiários se dizem "de Jesus"?

[originalmente postado como tópico em minha comunidade do orkut *Perguntas Cristãs Ridículas* http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs?cmm=14446807&tid=5513500224259778668

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

De Obama e do american way of life

O discurso de posse de Obama é permeado de referências religiosas pois a “América” nasceu clamando a si mesma um certo “destino manifesto” de concretização do ideal de uma sociedade livre e perfeita. Obama se colocou como o ápice, a comprovação, de que a promessa não era vazia. O sonho americano tão propalado pode ser atingido. Até pode, se pautado por uma série de renúncias e escolhas acertadas.

A democracia americana, tão complicada para nós, carrega uma série de pressupostos e características estranhas. Lula, por exemplo, jamais seria eleito lá por suas raízes “vermelhas” e sua família disfuncional, leia-se, uma filha fora do casamento. O político americano não separa a vida profissional da pessoal, ele mais “vende uma imagem” do que, de fato, trabalha. Mesmo quando o assunto é religião.

Obama teve que inclusive mudar de igreja pq seu pastor estava queimando seu filme. No Brasil, ninguém sabe se e onde o presidente Lula comunga ou quem é seu padre.

No Brasil dona Marisa Letícia pode fazer quantas plásticas quiser que não vão escrutinar as intervenções em todas as revistas. O Lula pode pegar um sapato, mostrar pros jornalistas e dizer sorrindo: “vcs não vão atirar um em mim não, né? Ó que eu sou corintiano...”. Se Obama fizesse isso, criaria um grande constrangimento, que abalaria a relação entre a presidência e o quarto poder.

Eu prefiro um dolce far niente a ter 5 mil a mais o banco cada final de ano. Tenho dinheiro para viver. Não vivo para ter dinheiro. Prefiro com certeza estar informada sobre o andamento das novelas a ficar malhando.

Mesmo pq no nosso subconsciente, de acordo com Gilberto Freyre, suar é coisa de escravo. Trabalhar é coisa de escravo. Coisas da brasilidade...

Então, Dora, entendo e respeito o arquétipo americano da prosperidade e do conforto. Mas as coisas não são tão simples. Sabemos que o american way of life não pode ser disfrutado por todos. Se todo o planeta vivesse no padrão classe-média americana, precisaríamos de 4 planetas Terra para suprir nossas demandas.

O consumismo exacerbado, simbolizado por sempre novos celulares que precisamos comprar, novos monitores e computadores mais velozes a cada ano, ter que trocar seu VCR por um DVD e logo logo por um Blue Ray, isso é completamente DOIDO pra mim. Eu não preciso ter qualidade técnica de estúdio de cinema na minha sala! Não sou contra a tecnologia, mas sou contra a idéia de que eu apenas serei uma pessoa plena se tiver o último iMac, o último iPhone, o último Wii, a maior SUV, uma casa de 5 suítes com aquecimento central e tiver fotos das férias no Hawaii pra mostrar pra visitas. Não estou dizendo que esse seja o seu caso, mas é essa imagem meio frívola que tenho do “americano médio”.

Para um americano, uma casa não é um local onde seres humanos se abrigam e vivem. Uma casa é uma pilha de dinheiro a ser sacada numa nova hipoteca sempre que possível. Há muito dinheiro de mentira circulando nos EUA e isso acabou resultado na demissão de 480 operários em uma única metalúrgica aqui da cidade onde moro. Todo esse dinheiro de mentira está sendo demascarado e que vai pagar o preço seremos todos nós.

Toda essa terceirização, redução de custos, padronização, cartelização de mercados, transferências de fábricas para locais de legislação mais frágil, é uma onda predatória que está consumindo a economia saudável, que traz prosperidade às comunidades. Está ficando cada vez mais exposto o grave defeito que, do seio do capitalismo, iniciará sua ruína e superação.

Espero estar viva para ver. :)

Publicado originalmente em: Os EUA são mais poderosos porque são crentes? -http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs.aspx?cmm=811391&tid=5293587427596872996


quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A extração de um fetus in fetu é assassinato?

Já é conhecida a postura tradicional de igrejas mais retrógradas acerca da proibição completa e absoluta do aborto em qualquer circunstância, mesmo nas autorizadas pela legislação brasileira, como estupro, anencefalia e risco de vida para a gestante.

Pois bem, gostaria de saber a posição destas religiões sobre o fenômeno fetus in fetu, ou seja, um feto dentro de outro feto que é caracterizado quando o corpo de um gêmeo é absorvido e se desenvolve dentro do corpo de seu irmão.

Se um aglomerado de 8 células é equivalente a uma “pessoa”, bem mais é uma “pessoa” o teratoma fetus in fetu, que chega a desenvolver ossos, dentes e cabelo no interior de seu hospedeiro, parasitando seus fluídos vitais e prejudicando sua saúde.

Em uma breve pesquisa na internet encontrei vários casos interessantes, que valem ser citados:

Indiano adulto “grávido” de seu parasita e imagem de um teratoma fetus in fetu extraído http://diariodebiologia.com/2008/12/gemeo-parasita-fetus-in-fetu/

Menina de 1 ano “grávida” http://nescawtv2.blogspot.com/2008/12/menina-de-1-ano-grvida.html

Menino de sete meses tinha um feto na barriga http://clubecetico.org/forum/index.php?action=printpage;topic=3063.0

Vários casos de fetus in fetu http://medicinaextra.blogspot.com/2008/11/fetus-in-feto.html

Portanto, as perguntas são:

A retirada de um gêmeo parasita, um fetus in fetu é considerada assassinato? É considerada aborto? O Teratoma fetus in fetu é uma “pessoa”?

Caso um adepto de uma religião retrógrada tenha um teratoma fetus in fetu que esteja arriscando sua vida, ele deve recusar-se a extirpá-lo, acelerando assim a própria morte? Ou caso seja possível extirpar o teratoma e mantê-lo vivo alimentado por aparelhos, esse deveria ser a escolha certa a fazer? O gêmeo parasita deve ser mantido vivo artificialmente pois mata-lo seria “eutanásia”?

Um teratoma fetus in fetu deve ser batizado e sepultado como uma “pessoa”?

Tópico postado na comunidade do orkut *Religião & Vida* http://www.orkut.com.br/Main#CommMsgs.aspx?cmm=811391&tid=5317809703093954668

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