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quarta-feira, 5 de março de 2014

Metade - Oswaldo Montenegro

Que a força do medo que eu tenho

Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca
Porque metade de mim é o que eu grito
A outra metade é silêncio

Que a música que ouço ao longe
Seja linda ainda que tristeza
Que a mulher que amo seja pra sempre amada
Mesmo que distante
Pois metade de mim é partida
A outra metade é saudade

Que as palavras que falo
Não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor
Apenas respeitadas como a única coisa
Que resta a um homem inundado de sentimentos
Pois metade de mim é o que ouço
A outra metade é o que calo

Que a minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que mereço
Que a tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada
Porque metade de mim é o que penso
A outra metade um vulcão

Que o medo da solidão se afaste
E o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
Que o espelho reflita meu rosto num doce sorriso
Que me lembro ter dado na infância
Pois metade de mim é a lembrança do que fui
A outra metade não sei

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria
Pra me fazer aquietar o espírito
E que o seu silêncio me fale cada vez mais
Pois metade de mim é abrigo
A outra metade é cansaço

Que a arte me aponte uma resposta
Mesmo que ela mesma não saiba
E que ninguém a tente complicar
Pois é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Pois metade de mim é plateia
A outra metade é canção
Que a minha loucura seja perdoada
Pois metade de mim é amor
E a outra metade também


quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Vou-me embora pra Pasárgada - Manuel Bandeira


Vou-me embora pra Pasárgada

Lá sou amigo do rei

Lá tenho a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

 

Vou-me embora pra Pasárgada

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz

Lá a existência é uma aventura

De tal modo inconseqüente

Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente

Vem a ser contraparente

Da nora que nunca tive

 

E como farei ginástica

Andarei de bicicleta

Montarei em burro brabo

Subirei no pau-de-sebo

Tomarei banhos de mar!

E quando estiver cansado

Deito na beira do rio

Mando chamar a mãe-d'água

Pra me contar as histórias

Que no tempo de eu menino

Rosa vinha me contar

Vou-me embora pra Pasárgada

 

Em Pasárgada tem tudo

É outra civilização

Tem um processo seguro

De impedir a concepção

Tem telefone automático

Tem alcalóide à vontade

Tem prostitutas bonitas

Para a gente namorar

 

E quando eu estiver mais triste

Mas triste de não ter jeito

Quando de noite me der

Vontade de me matar

— Lá sou amigo do rei —

Terei a mulher que eu quero

Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada.




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sábado, 17 de agosto de 2013

Como melhorar a qualidade dos seus sonhos


Nesta sexta feira 16/08/2013 aconteceu-me algo incrível. Só precisaria dar aulas às 12:30, portanto na noite anterior coloquei meu celular para despertar às 10:00 e às 10:10.

Pontualmente às 8:06 minha cachorrinha Amy acordou-me gemendo aflita, olhei as horas, pensei "putz, tava num baita sonho legal", mas me levantei e abri a porta da casa para ela poder ter acesso ao jardim, caso tivesse vontade de ir ao banheiro. Estava frio. Voltei à cama para aproveitar o tempo que me restava de sono, e deitei com o pensamento "será que consigo retomar aquele sonho?"

Aquele sonho sei que não retomei. Mas tive outro, desta vez interrompido pelo sinal das 10:00, do qual guardo lembrança vívida.

O tema era "passarinhos".

Amy caçava passarinhos, e estava a brincar com um filhotinho de canário amarelo. Eu pegava o filhotinho, surpreendia-me de estar inteiro, e o adicionava à gaiola do meu canário Frank Sinatra. Anda no mesmo sonho, Amy caçava outro canário, desta vez adulto, e eu também o pegava nas mãos e o colocava na gaiola no Frank.

Então, mesmo no sonho, me passou pela cabeça que em inúmeras situações isso se repetira, e à esta altura, já devia estar lotada, com dúzias de pássaros oníricos a gaiola do pequeno Frank.

Então percebi que tenho tido inúmeros sonhos envolvendo pássaros. E, ainda deitada na cama, percebi que o "ruído de fundo" do meu sono era o piado de dezenas de pássaros, de variadas espécies, na jaqueira que faz sombra à minha casa. E que, da área de serviço, já cantava alto, reclamando de ainda estar coberto, o meu pequeno Frank.

Todos estes elementos - Amy caçadora de pássaros, o cantar do Frank, e os piados insistentes dos pássaros na jaqueira - resultavam-me num sonho leve, delicioso, propício e feliz: eu acompanhando a Amy caçando seus passarinhos, e tal qual num "pesque e solte", ao invés de ela os matar, eu os guardava, seguros, a fazer companhia ao já idoso e não tão mais solitário canário Frank, que herdei de meu avô.

Dreamgirl - Dave Matthews Band http://youtu.be/uoS_RYoDwNw

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sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Legiao Urbana - Tempo Perdido

Todos os dias quando acordo
Não tenho mais
O tempo que passou
Mas tenho muito tempo
Temos todo o tempo do mundo...

Todos os dias
Antes de dormir
Lembro e esqueço
Como foi o dia
Sempre em frente
Não temos tempo a perder...

Nosso suor sagrado
É bem mais belo
Que esse sangue amargo
E tão sério
E Selvagem! Selvagem!
Selvagem!...

Veja o sol
Dessa manhã tão cinza
A tempestade que chega
É da cor dos teus olhos
Castanhos...

Então me abraça forte
E diz mais uma vez
Que já estamos
Distantes de tudo
Temos nosso próprio tempo
Temos nosso próprio tempo
Temos nosso próprio tempo...

Não tenho medo do escuro
Mas deixe as luzes
Acesas agora
O que foi escondido
É o que se escondeu
E o que foi prometido
Ninguém prometeu
Nem foi tempo perdido
Somos tão jovens...

Tão Jovens! Tão Jovens!...
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quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Legiao Urbana - Metal contra as nuvens

Letra: Renato Russo

Não sou escravo de ninguém
Ninguém é senhor do meu domínio
Sei o que devo defender
E por valor eu tenho
E temo o que agora se desfaz

Viajamos sete léguas
Por entre abismos e florestas
Por Deus nunca me vi tão só
É a própria fé o que destrói
Estes são dias desleais

Eu sou metal
Raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal
Eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal
Quem sabe o sopro do dragão

Reconheço meu pesar
Quando tudo é traição
O que venho encontrar
É a virtude em outras mãos

Minha terra é a terra que é minha
E sempre será
Minha terra
Tem a Lua, tem estrelas
E sempre terá

Quase acreditei na sua promessa
E o que vejo é fome e destruição
Perdi a minha sela e a minha espada
Perdi o meu castelo e minha princesa

Quase acreditei, quase acreditei
E, por honra, se existir verdade
Existem os tolos e existe o ladrão
E há quem se alimente do que é roubo
Mas vou guardar o meu tesouro
Caso você esteja mentindo

Olha o sopro do dragão (4x)

É a verdade o que assombra
O descaso que condena
A estupidez o que destrói
Eu vejo tudo que se foi
E o que não existe mais

Tenho os sentidos já dormentes
O corpo quer, a alma entende
Esta é a terra-de-ninguém
Sei que devo resistir
Eu quero a espada em minhas mãos

Eu sou metal - raio, relâmpago e trovão
Eu sou metal: eu sou o ouro em seu brasão
Eu sou metal: me sabe o sopro do dragão

Não me entrego sem lutar
Tenho ainda coração
Não aprendi a me render
Que caia o inimigo então

Tudo passa
Tudo passará (3x)

E nossa história
Não estará
Pelo avesso assim
Sem final feliz
Teremos coisas bonitas pra contar
E até lá
Vamos viver
Temos muito ainda por fazer
Não olhe pra trás
Apenas começamos
O mundo começa agora, ahh!
Apenas começamos

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quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

O ultimo dia - Paulinho Moska

Meu amor
O que você faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz o que você faria

Ia manter sua agenda
De almoço, hora, apatia
Ou esperar os seus amigos
Na sua sala vazia

Meu amor
O que você faria se só te restasse um dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz o que você faria

Corria prum shopping center
Ou para uma academia
Pra se esquecer que não dá tempo
Pro tempo que já se perdia

Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia
Se o mundo fosse acabar
Me diz, o que você faria

Andava pelado na chuva
Corria no meio da rua
Entrava de roupa no mar
Trepava sem camisinha

Meu amor
O que você faria?
O que você faria?

Abria a porta do hospício
Trancava a da delegacia
Dinamitava o meu carro
Parava o tráfego e ria

Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz o que você faria

Meu amor
O que você faria se só te restasse esse dia?
Se o mundo fosse acabar
Me diz o que você faria
Me diz o que você faria
Me diz o que você faria...
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sábado, 8 de dezembro de 2012

Porque escrevo este blog

É possível q grande parte das pessoas q leêm os textos do meu blog não compreendam o q me motiva a escrever. Os esclarecerei.

1 - Desabafar.

Quando comecei a escrever isso não estava lá muito claro. A princípio, queria divulgar textos legais, poesias, músicas, e até receitas q não queria perder. Depois comecei a escrever sobre minhas experiências como professora, refletindo sobre as coisas q me aconteciam, os problemas q enfrentava, as histórias de meus alunos.

Percebi q escrever me ajudava psicologicamente. Q ao colocar essas coisas "pra fora" eu ficava aliviada. O assunto meio q "parava de incomodar tanto". Ao escrever, fixando fatos e pensamentos, eu descarregava as emoções q esses assuntos me traziam, e passava a vê-los de forma mais "distanciada" ou "bem resolvida".

Acontecia de um "causo" de determinado aluno, ou uma efeméride q me envolvia privar-me do sono, circulando continuamente em meus pensamentos, até q eu escrevia um texto sobre isso e a questão parava de me incomodar.

Quase como se ao "dar upload" a uma memória, eu a pudesse remanejar para meu "arquivo morto" mental e então "colocar uma pedra sobre o assunto", uma vez q sobre ele já escrevi, refleti; e quando o quiser revisitar, estará na ponta dos dedos.

Ao escrever sobre meu presente e perceber q isso me fazia bem, tive a idéia q nos leva ao segundo motivo q me faz escrever.

2 - Divulgar meu testemunho de época.

Como historiadora conheço o valor e a importância de documentos de época. E não apenas são documentos de época "textos oficiais", jornais, livros. Tb são matéria-prima da História diários, cartas pessoais, declarações, testamentos, depoimentos. São instrumentos fundamentais para o estudo da História das Idéias, da Mentalidade, do Cotidiano.

Ao relatar minhas impressões sobre a vida, elas podem até não ser relevantes ou "impressionantes" hoje. Mas daqui a 200 anos este blog pode ser um documento muito útil para pesquisadores estudarem a vida neste princípio do século XXI. Meu testemunho pode parecer enfadonho hoje, mas pode ser muito interessante conforme os séculos passam.

Outra questão subjacente é o fazer-me conhecer por meus descendentes: netos, trinetos, tataranetos, q não virei a conhecer. Isso visando procurei escrever também sobre meus antepassados, citando nomes e lugares, para q no futuro minha descendência saiba sua origem.

Busquei na memória e fiz pesquisa com minha avó para q ela me contasse mais detalhes sobre estes fatos pregressos q se passaram em sua infância, e os relatei o mais fielmente possível. Se não tivesse lhe perguntado esses fatos morreriam com ela. Se eu não tomasse a iniciativa de os eternizar por escrito, no futuro os descendentes dos Bianchetti, Pilon, Gonçalves, Alves, Reiter, Ignácio, Novais, Silva, Tomasella, Ramos, Alencar, Massuella, jamais saberiam de q forma essas famílias se uniram e aparentaram-se. Eu tenho a convivência com minha avó Tula q seus demais descendentes não têm, portanto apenas eu posso tomar o depoimento diretamente de sua testemunha ocular, e assim preservar a História Oral e as tradições da família. As quais "morreriam" se eu não as escrevesse.

3 - Publicar ensaios e reflexões.

Há pelo menos 9 anos participo ativamente de comunidades virtuais de debates teológicos. Comecei ainda nos tempos do Orkut com as comunidades Perguntas Cristãs Complicadas, Perguntas Cristãs Complexas, Religião & Vida (criminosamente deletada) e a Perguntas Cristãs Ridículas. Esta última, criei e moderava com muito prazer. Por sua causa dui excluída do Orkut, e passei a moderar a Bnei Noach - Filhos de Noé no Facebook.

Nenhum dinheiro no mundo seria capaz de pagar pelo treinamento q nessas comunidades tive sobre praticamente todos os aspectos da experiência humana. Como cheguei a participar de tudo isso vale o relato.

Sempre tive desde criança uma "sede" pelo transcendental. Apesar de nunca ter gostado de ir no centro espírita (o q vale outro texto), sentia um certo "comichão" q me levava a tentar me conectar e descobrir o q "havia além" deste mundo. Já na faculdade, ao aprender justamente sobre a importância dos documentos de época, me decidi a ler o mais fundamental deles. Também fui estimulada a isso pela presença no campus de missionários evangélicos americanos, do grupo "Alpha e Ômega". Queria com eles praticar e desenferrujar meu inglês. Mas o único assunto sobre o qual queriam conversar era "a Bíblia".

Não me fiz de rogada. Comprei uma boa tradução (a "Bíblia de Jerusalém") e li. Não li inteira, confesso. Pulei os profetas. Mas li todo o resto, Antigo e Novo Testamento. Acho q li uns 70% da Bíblia católica, mais extensa q a protestante e, obviamente, q o Tanach hebreu. Antes de começar a ler, dela tinha uma idéia superficial, preconceituosa. E talvez prosseguisse a ter essa visão não fosse minha formação como historiadora.

É um texto cru, sangrento, machista, xenófobo, violento. Retrata sacrifícios humanos, recomenda o genocídio completo dos cananeus, prescreve apedrejamentos, rituais sacrificiais, espalha o preconceito e afirma q a mulher é propriedade do marido. Completamente chocante.

Sim, chocante. Compreendido com os olhos de hoje. Porém, se analisado sob a perspectiva histórica, todos esses temas ganham outros matizes. O Antigo Testamento foi escrito na Idade do Bronze, por um povo de pastores nômades q tentava sobreviver no deserto, ameaçado por diversos poderosos impérios, e por eles escravizados.

Ao ler as Escrituras Hebraicas sob o prisma de sua historicidade, esses detalhes chocantes cessam de incomodar. Não há como exigir de um texto fixado há 2.500 anos conceitos como o respeito aos Direitos Humanos, Auto-determinação dos povos, liberdade de culto, igualdade entre os sexos. Seria um completo anacronismo, por exemplo, descartar a Bíblia por ser machista, uma vez q a Revolução Sexual, q tanto me beneficia, aconteceu há meros 50 anos.

Uma vez isso compreendido, outros temas do texto saltam aos olhos. O conceito de responsabilidade civil, de misericórdia, a prescrição de q o escravo deve ser libertado após 7 anos, ou q se for agredido ganha a liberdade, o respeito ao trabalhador, aos órfãos e viúvas, o respeito aos animais, a recomendação do perdão, a necessidade do devido processo legal, testemunhas e defesa num julgamento. O "amai ao próximo como a ti mesmo" (Levítico 19:18).

Assim analisado em todas as suas matizes, à luz da compreensão histórica, vemos q todos estes temas eram, em sua época, inéditos e revolucionários. Assim nos damos conta da profundidade da contribuição do povo hebreu para a construção do ethos e da práxis ocidentais. E pq nossa civilização não é "Ocidental", mas Judaico-Cristã-Ocidental.

E quanto mais eu lia, estudava, analisava, questionava esse texto, mais ele se engrandecia em significados e profundidade. Confesso: o q começou com a curiosidade de um passatempo ou oportunidade de agregar um "acessório intelectual" para poder debater teologia em grau profundo, tornou-se uma paixão quase obsessiva.

E quanto mais eu lia e debatia nessas comunidades virtuais, mais eu me interessava em saber mais. Foi assim q me direcionei aos estudos judaicos e comecei a ter algumas idéias, argumentos e mesmo "teses" teológicas próprias. Vi q os contendores de idéias católicos e evangélicos eram "fichinha". Q estudo realmente sério eu teria em sinagogas e yeshivás. E passei a investir nestes interlocutores, q realmente sabem do q estão falando, não espalham "achismos" nem "o q é loucura par os sábios" (1 Coríntios 1:23).

E assim comecei a produzir textos com meus modestos estudos, reflexões, questionamentos e afins sobre as Escrituras. Muitas vezes me surpreendi em pleno sábado à noite me deleitando em elaborar idéias entre o Mishnê Torah e o Moré HaNevuchim (Guia dos Perplexos)!

4 - Treinar a arte da escrita.

Ainda hoje não sei se levo muito jeito para professora. Também não sei muito ao certo se gostaria de trabalhar na iniciativa privada, tornar-me empreendedora, fazer uma conversão ortodoxa seguida de Aliyah, virar hippie e me mudar pra Alto Paraíso de Goiás, casar ou comprar ou comprar uma bicicleta.

Certa vez numa grave crise de identidade em plena noite insone passei horas me questionando sobre meu propósito nesta vida, e perguntei-me: "o q eu queria ser quando crescesse?". Só uma resposta me veio à lembrança. Sempre sonhei em um dia ser escritora. Lembrei-me das dúzias de cadernos q preenchia com fantasias quando era pré-adolescentes, dos lugares exóticos e nomes pitorescos q dava aos meus personagens. Das centenas de poemas q escrevi e mantenho bem guardadinhos, como trunfos na manga, para procurar uma editora num momento de desemprego.

Escrevendo neste blog não apenas eu atinjo todos os objetivos supracitados, como treino, refino, destilo, instilo, sofistico e lapido meu "chamamento literário". Percebo meus cacoetes. O uso do "q" e não "quê". Meus vícios de linguagem, pedantismos, auto-comiseração, auto-indulgência, omissões, senões e pontos fracos. Onde sou chata e onde pego direto no ponto. Treino a construção de imagens multi-sensoriais, com certa beleza poética.

Vou estudando a arte q nenhum mestre pode ensinar: como ser um observador arguto, perspicaz, e às vezes inclemente, de si mesmo, dos q me cercam, da sociedade e da cultura q nos produziu. E a reproduzir essas observações em apenas 27 caracteres, de forma bela e quiçá relevante.
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sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Maestro II

Por ti esperei horas vazias
Dias inteiros
E até mais eu esperaria.

Contigo faria
O que aos outros negaria
Me ensinaste a ver na vida
Outros ângulos e vieses
Me inspiraste
Me expiraste
Me exasperaste
Me desesperaste

Por ti me despiria de meu orgulho
Por ti faria juz ao meu nome
Ao teu nome.
Você é o dobro de mim
E eu tua metade
Ao menos de minha parte, em minhas delusões.

Me ensinaste
Que no amor há
Muito mais a se descobrir.
Não tenho receio de ti,
Mas te temo.

Por ti estremeço
E sei q isso não é recíproco
Mas não tenho medo de sofrer,
Pois mesmo com este pouco
Que me dás, ou emprestas,
Já saí ganhando
Já tive lições
Sobre o amor e sobre a vida
Já tenho o corpo
E o coração despertos.

És experiente e eu adolescente
És Homem e eu menina
És mestre e eu aprendiz,
Sedenta por lições
Sobre o amor, sobre a vida,
E sobre como ir além do amor e da vida,
Sobre como ser muito mais q mestre ou aprendiz.

A JPNSC, ano 2.000

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Legiao Urbana - Indios

Quem me dera ao menos uma vez
Ter de volta todo o ouro que entreguei a quem
Conseguiu me convencer que era prova de amizade
Se alguém levasse embora até o que eu não tinha.

Quem me dera ao menos uma vez
Esquecer que acreditei que era por brincadeira
Que se cortava sempre um pano-de-chão
De linho nobre e pura seda.

Quem me dera ao menos uma vez
Explicar o que ninguém consegue entender
Que o que aconteceu ainda está por vir
E o futuro não é mais como era antigamente.

Quem me dera ao menos uma vez
Provar que quem tem mais do que precisa ter
Quase sempre se convence que não tem o bastante
Fala demais por não ter nada a dizer.

Quem me dera ao menos uma vez
Que o mais simples fosse visto
Como o mais importante
Mas nos deram espelhos e vimos um mundo doente.

Quem me dera ao menos uma vez
Entender como um só Deus ao mesmo tempo é três
E esse mesmo Deus foi morto por vocês
Sua maldade, então, deixaram Deus tão triste.

Eu quis o perigo e até sangrei sozinho
Entenda
Assim pude trazer você de volta pra mim
Quando descobri que é sempre só você
Que me entende do início ao fim.

E é só você que tem a cura pro meu vício
De insistir nessa saudade que eu sinto
De tudo que eu ainda não vi.

Quem me dera ao menos uma vez
Acreditar por um instante em tudo que existe
E acreditar que o mundo é perfeito
E que todas as pessoas são felizes.

Quem me dera ao menos uma vez
Fazer com que o mundo saiba que seu nome
Está em tudo e mesmo assim
Ninguém lhe diz ao menos, obrigado.

Quem me dera ao menos uma vez
Como a mais bela tribo
Dos mais belos índios
Não ser atacado por ser inocente.

Eu quis o perigo e até sangrei sozinho
Entenda
Assim pude trazer você de volta pra mim
Quando descobri que é sempre só você
Que me entende do início ao fim.

E é só você que tem a cura pro meu vício
De insistir nessa saudade que eu sinto
De tudo que eu ainda não vi.

Nos deram espelhos e vimos um mundo doente
Tentei chorar e não consegui.

Renato Russo

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Quadrilha - Carlos Drummond de Andrade



João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Na vespera de não partir nunca - Fernando Pessoa

Na véspera de não partir nunca
Ao menos não há que arrumar malas
Nem que fazer planos em papel
Com acompanhamento involuntário de esquecimentos,
Para o partir ainda livre do dia seguinte.
Não há que fazer nada
Na véspera de não partir nunca.
Grande sossego de já não haver sequer de que ter sossego!
Grande tranquilidade a que nem sabe encolher ombros
Por isto tudo, ter pensado o tudo
É o ter chegado deliberadamente a nada.
Grande alegria de não ter precisão de ser alegre,
Como uma oportunidade virada do avesso.
Há quantas vezes vivo
A vida vegetativa do pensamento!
Todos os dias sine linea
Sossego, sim, sossego...
Grande tranquilidade...
Que repouso, depois de tantas viagens, físicas e psíquicas!
Que prazer olhar para as malas fitando como para nada!
Dormita, alma, dormita!
Aproveita, dormita!
Dormita!
É pouco o tempo que tens! Dormita!
É a véspera de não partir nunca!

27-9-1934

Via Álvaro de Campos

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Poema de Sete Faces - Carlos Drummond de Andrade

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

sábado, 18 de agosto de 2012

Soneto Amar, de Florbela Espanca

Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...

Soneto Lingua portuguesa, de Olavo Bilac

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

Em que da voz materna ouvi: "meu filho!",
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

Língua Portuguesa - Olavo Bilac

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Mar Português e Dactilografia, de Fernando Pessoa

Mar Português - do livro "Mensagem"

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!

Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.

Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

——————

Dactilografia, via Álvaro de Campos

Traço, sozinho, no meu cubículo de engenheiro, o plano,
Firmo o projeto, aqui isolado,
Remoto até de quem eu sou.
Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro,
O tique-taque estalado das máquinas de escrever.
Que náusea da vida!
Que abjeção esta regularidade!
Que sono este ser assim!

Outrora, quando fui outro, eram castelos e cavaleiros
(Ilustrações, talvez, de qualquer livro de infância),
Outrora, quando fui verdadeiro ao meu sonho,
Eram grandes paisagens do Norte, explícitas de neve,
Eram grandes palmares do Sul, opulentos de verdes.

Outrora. Ao lado, acompanhamento banalmente sinistro,
O tique-taque estalado das máquinas de escrever.
Temos todos duas vidas:
A verdadeira, que é a que sonhamos na infância,
E que continuamos sonhando, adultos, num substrato de névoa;
A falsa, que é a que vivemos em convivência com outros,
Que é a prática, a útil,
Aquela em que acabam por nos meter num caixão.

Na outra não há caixões, nem mortes,
Há só ilustrações de infância:
Grandes livros coloridos, para ver mas não ler;
Grandes páginas de cores para recordar mais tarde.
Na outra somos nós,
Na outra vivemos;
Nesta morremos, que é o que viver quer dizer;
Neste momento, pela náusea, vivo na outra ...

Mas ao lado, acompanhamento banalmente sinistro,
Ergue a voz o tique-taque estalado das máquinas de escrever

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Para Viver um Grande Amor - Vinicius de Moraes

Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... — não tem nenhum valor.

Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor.

Para viver um amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fidelidade — para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.

Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor.

É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que — que não quer nada com o amor.

Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva oscura e desvairada não se souber achar a bem-amada — para viver um grande amor.


Texto extraído do livro "Para Viver Um Grande Amor", de Vinícius de Moraes, José Olympio Editora - Rio de Janeiro, 1984, pág. 130.

domingo, 22 de julho de 2012

Soneto de Camões: Amor é um fogo que arde sem se ver

Amor é um fogo que arde sem se ver,
é ferida que dói, e não se sente;
é um contentamento descontente,
é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
é um andar solitário entre a gente;
é nunca contentar se de contente;
é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;
é servir a quem vence, o vencedor;
é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor
nos corações humanos amizade,
se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Luís Vaz de Camões

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Retrato - Cecilia Meireles

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.


Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.


Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- em que espelho ficou perdida a minha face?

Cecília Meireles

terça-feira, 19 de junho de 2012

Estou tonto - Fernando Pessoa via Alvaro de Campos

Estou tonto,
Tonto de tanto dormir ou de tanto pensar,
Ou de ambas as coisas.
O que sei é que estou tonto
E não sei bem se me devo levantar da cadeira
Ou como me levantar dela.
Fiquemos nisto: estou tonto.
Afinal
Que vida fiz eu da vida?
Nada.
Tudo interstícios,
Tudo aproximações,
Tudo função do irregular e do absurdo,
Tudo nada.
É por isso que estou tonto ...

Agora
Todas as manhãs me levanto
Tonto ...

Sim, verdadeiramente tonto...
Sem saber em mim e meu nome,
Sem saber onde estou,
Sem saber o que fui,
Sem saber nada.

Mas se isto é assim, é assim.
Deixo-me estar na cadeira,
Estou tonto.
Bem, estou tonto.
Fico sentado
E tonto,
Sim, tonto,
Tonto...
Tonto.

Fernando Pessoa via Álvaro de Campos

terça-feira, 12 de junho de 2012

Reinvencao - Cecilia Meireles

A vida só é possível reinventada.
Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas. . .
Ah! Tudo bolhas que vêm de fundas piscinas de ilusionismo... – mais nada.
Mas a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.
Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços.
Projeto-me por espaços cheios da tua Figura.
Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura.
Não te encontro, não te alcanço...
Só - no tempo equilibrada, desprendo-me do balanço que além do tempo me leva.
Só - na treva, fico: recebida e dada.
Porque a vida, a vida, a vida, a vida só é possível reinventada.

Cecília Meireles
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