sábado, 16 de abril de 2011

De Alanis Morissette e os meus 1990

Pergunta retórica:

“Como vc se dá conta de que testemunhou uma celeríssima mudança sócio-cultural?”

- Quando vc, ainda nos seus 20 anos, percebe que as músicas que vc cantou na sua adolescência já são senis, datadas, impossibilitadas pela atual conjuntura.

Percebi isso reouvindo 2 músicas de Alanis Morissette, ambas compostas há menos de 15 anos e, já agora, sem sentido pelas circunstâncias materiais.

O disco adulto de estréia da canadense Alanis Morissette foi lançado em 1996 sob o nome “Jagged Little Pill”. Apenas soube dele 1 ano depois, quando contava eu 14 anos e estudava na E. E. “Professora Irene de Lima Paiva” ao lado dos meus ainda amigos Maristela Matsuda, Romeu Marinho Cardona Ubeda, Gisele Ferreira Bailer, Thaís Nogueira Dias e Camila Nalesso de Andrade. Juntos cursamos as sétima e oitava séries, passando conjuntamente por inúmeras experiências definidoras de nossa personalidade e que ainda nos fazem sentir carinho uns pelos outros, apesar da distância no tempo e no espaço em que jazem estas lembranças.

Outros amigos desta época dos quais me lembro com apreço são as gêmeas Cristina Harumi, que namorava ao mulato de olhos verdes Martinho, e Cristiane Hatsumi, bem como do Sérgio “Chaminé", da Aline "Tuca", do Élcio desenhista, da Rosana, do lindíssimo Fábio (Binho), do Victor VTR, do Daniel/Abel e do Wagner. Curioso que dos 15 amigos supracitados, 6 são nipo-brasileiros. Nunca havia parado para pensar nisso, mas creio que 30% de nossa sala de aula era nipônica. E todos eram “puro-sangue”, nenhum mestiço. Rsrs...

Nas minhas fotos com meus amigos é impossível não reparar o quanto a composição étnica de nosso grupo é representativa da variabilidade racial dos brasileiros. Quase como se nos tivéssemos imposto cotas. Ou quase como se aceitássemos amigos tal como viessem; pretos, brancos, japoneses, de olho azul, verde ou vermelho; heteros, homos; pobres ou ricos. Desta forma final foi. Temos 2 brasileiras típicas, latinas, misturas em variados graus neste grupo em mim e Gisele, além de um de magníficos olhos azuis no Romeu, uma oriental na Maty e mais tarde um negro no Chicote.

Grupo de melhores amigos que poderia servir de exemplo arquetípico num anúncio sobre a irmandade e harmonização universal das raças e opções sexuais, dados que 2 de nós revelaram-se posteriormente homossexuais, contando com total acolhimento do grupo. Por essas e por outras continuamos mais do que amigos, mas irmãos ligados pelos laços eletivos duma amizade bem-cimentada, antiga e profunda. Entregaria sem temores a chave de minha casa e minha senha no banco para qquer um deles, sem temores. O mesmo não posso dizer sobre grande parte dos que são ligados a mim pelo sangue...

À essa época, entre nossos 13 e 14 anos, havia 2 “tribos” básicas em nossa escola: os pagodeiros e os rockeiros. Como nunca vi em mim talento para balançar ritmadamente os quadris nem sentia pulsar em minhas veias reminiscências afro-brasileiras, eu, e meus amigos (em grande parte sansei – ou seria nikkei?), éramos, portanto, dos “roqueiros”.

Conheci Alanis pela MTV, ou “/Ême-Tê-Vê/”, como diria Caetano Veloso, ao assistir ao seu belíssimo videoclipe para “You Oughta Know”. Rapidamente comprei seu CD, e o ouvia compulsivamente em meu leitor de CD ganho no bingo. Alanis era forte, resolvida, poderosa, no manche de sua vida. Cantava suas confissões sexuais, adolescentes, seu coração partido, suas indecisões, seus planos, suas reminiscências e traumas infantis. Sua voz era carregada por uma raiva que eu partilhava e uma resolução pela qual ansiava.

Grande parte do motivo de eu ter-me tornado fluente em inglês foi o desejo de cantar com perfeição suas letras, quase raps cantados raivosamente. Alanis era de uma beleza tangível, não-desafiadora, algo “comum”, ainda que perfeitamente plástica. Numa expressão americana, ela era “the girl next door”, com seus profusos, abundantes e longos cabelos castanhos. Impossível não remeter a Alanis a inspiração para a cachoeira loura de Julia Stiles no filme desta época que lançou a carreira do tristemente já falecido à la River Phoenix e James Dean, Heath Ledger. Toda a atitude confrontadora e auto-suficiente de Julia Stiles em “10 things I hate about you” é tributária do arquétipo da moça independente, bem-resolvida e reativa inspirado em Alanis, que estabeleu o arquétipo da rebeldia adolescente feminina no fim dos 1990. E portanto, minha meta pessoal. Aos 15 anos meu sonho eram compor músicas como Alanis. Em especial, sua belíssima “Unsent”. Ainda farei minha própria Unsent, ainda que em prosa, repassando e nomeando todos meus ex-namorados. Estou ainda angariando coragem... ; P

O sucesso de seu primeiro álbum, pela Maverick de Madonna foi assombroso. Digno de remontada nota também foi o intervalo e a alternância temática entre seu primeiro e segundo álbuns. E mui surpreendente, para todos, executivos e consumidores da indústria fonográfica, foi a coragem de Alanis em conscientemente abrir mão do sucesso retumbante previamente garantido para seu segundo álbum, fosse ele uma variação sobre o tema do primeiro.

Mas entre seu primeiro e segundo álbuns Alanis passou por uma experiência que transformou seu próprio caráter: foi à Índia numa jornada espiritual, tal como The Beatles, que então conheceram Ravi Shankar, aventurando-se por novas sonoridades e paradigmas mentais. Após a abertura de seus caminhos e perspectivas, Alanis não mais poderia cantar sua vingança contra ex-namorados e suas atuais companheiras; não mais poderia culpar seus pais por todas as suas frustrações; não mais poderia colocar-se orgulhosamente como vítima ferida inocentemente pelas circunstâncias. Seus temas, sua postura, sua sonoridade, até o timbre de sua voz, mudaram completamente. Atingiu, como se diria em inglês, “the point of no return”.

Comprei o álbum antes de ver seu primeiro clipe na MTV. Sobre o Compact Disc, jazia uma foto de Alanis, nua, em posição fetal. Não vaidosamente à la Preta Gil. Mas candidamente à la Eva antes da fruta. Em seu segundo álbum Alanis desnudou-se para o mundo. E muitos de seus fãs não estavam preparados e rejeitaram seus segundo álbum, que revelou-se um relativo fracasso de vendas. A Iluminação não vende. O que vende são o sexo e a raiva, coisas baratas. Mais uma vez, ponto para Alanis por sua coragem. Por empreender e musicar sua valiosíssima jornada de engrandecimento espiritual.

Enquanto “Jagged Little Pill” soa como um rompante de uma adolescente revoltada, “Supposed Former Infatuation Junkie” soa como a lição de uma bodhisattva.

E é quase incompreensível a disparidade temática e sonora entre os dois discos. São discos de artistas diferentes, com certeza. O primeiro de uma moça auto-centrada, o segundo de uma mulher exo-centrada, ou mesmo acêntrica, crescida, despida das ilusões das aparências e do cultivo da auto-satisfação, como é tão típico no Ocidente.

A primeira “música de trabalho” com clipe deste segundo álbum, creio, foi “Thank U”, em cujo clipe Alanis canta, completamente despida, em Nova York; com apenas suas madeixas para cobrir-lhe os seios. Impressionante como a cena de “Vanilla Sky” em que Tom Cruise corre por uma Manhattan vazia. Assistir a ambas estas cenas foi brainstorming, transformador. Assim como ver Alanis interpretando ninguém menos que “Deus” no filme “Dogma” com Matt Damon e Ben Affleck. E ouvir sua inédita “Uninvited” nos letreiros finais de “City of Angels” com Nicholas Cage e Meg Ryan.

Após este seu segundo álbum, com estatura suficiente para reescrever o rock ocidental havia pouco mais que Alanis poderia fazer além de honrar seu egado inegável. Seu terceiro álbum “Unplugged MTV” trouxe uma combinação dos dois discos nateriores num novo arranjo. Antologia acrescida pelas inéditas “No Pressure over Capuccino” e “King of Pain”, cover do The Police de Sting.

Seus posteriores “Under Rug Swept” e “Flavors of Entanglement” trouxeram músicas quase dignas de Alanis, mas que nem de longe são uma evolução de “Supposed Former Infatuation Junkie”; e até creio que evoluir além disto seria pedir muito a quem quer que seja, e precise pelos próprios meios prover sua reiteração material ampliada, como diria o Professor Doutor István Jancsó, para minha tristeza já falecido.

Alanis compôs a trilha sonora de minha adolescência. E deu a deixa, com seu segundo álbum, para que toda uma geração ampliasse seus horizontes e possibilidades espirituais. Antes que Madonna pintasse seu cabelo de preto, se enveredasse pela pseudo-cabala e gravasse “Frozen”, Alanis já divulgara em CD sua experiência na Índia e a negação de seu ego.

Ao longo de todo o sobrecitado post, creio que estejam os leitores a se perguntar como músicas tão universais e atemporais como as de Alanis podem soar algo datadas. O demonstro.

Em Unsent, canta:

I’ll always have your back and be curious about you. About your career, your whereabouts...”

Em Hands Clean canta:

Fast forward to a few years later and no one knows except the both of us.”

Versos impossíveis atualmente, pós 2004, na era das redes sociais, que já não há segredos sobre relacionamentos íntimo-pessoais; e já não perdemos contato com nossos ex.

Grande parte de minhas emoções foram e continuam a ser musicadas pela trilha sonora dos álbuns de Alanis Morissette. Vejo com tristeza que as atuais gerações não a conheçam. Cantar a plenos pulmões e chorar com as músicas de Alanis contribuiu enormemente para definir meu caráter e meus paradigmas emotivos.

Thank U, Alanis for everything.

Minhas preferidas:

You Oughta Know

You learn

Forgiven

Head over Feet

Ironic

Thank U

Sympathetic Character

That I would be good

Can’t Not

Ur

I was hoping

Unsent

Joining you

Heart of the house

Uninvited

No Pressure over Cappucino

King of Pain

Hands clean

Flinch

Precious Illusions

2 comentários:

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  2. Eu não sei se ainda está ativa no blog, mas parei neste texto por acaso e achei fantástico: fundiu suas experiências pessoais, visuais e sensoriais com a história dos discos da Alanis. Muito bom. Caso, ainda leia os comentários, ficou bom demais! Abraços. P.S: SFIJ é meu disco favoritos da Alanis, composições que são tão a frente de seu próprio tempo que ainda não chegou no agora. Cléo Medeiros.

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