terça-feira, 20 de setembro de 2011

Eu, Analista de Sistemas?!

Quem entrar em meu perfil do Facebook verá uma informação curiosa e que parece fora de lugar em minha biografia: a de que eu estudei Análise de Sistemas no IFSP – Instituto Federal São Paulo, antes denominado CEFET.

Só para deixar claro: não cheguei a me formar, abandonei o curso logo no primeiro semestre, portanto que ninguém pense que sou “Analista de Sistemas” :P

Passar no vestibular, especialmente numa Universidade Pública é um sonho almejado por todos os vestibulandos e creio que alguns se sentirão mortificados de eu ter por vontade própria aberto mão de minha vaga “na Federal”. De fato, tal é lamentável. E sinto muitíssimo que como isso eu possa ter “roubado a vaga” de outro vestibulando. Esta seria minha segunda graduação, e como eu já me encontrava então empregada e razoavelmente bem-estabelecida em minha ocupação de professora, não me sentia tão estimulada a empreender todo um novo curso superior.

Mas comecemos do início desta história.

No final de 2009 meus caminhos estavam meio nebulosos, e eu me encontrava meio perdida em meus rumos. Nessas horas, dá vontade de jogar tudo para o alto, comprar uma bicicleta ou uma passagem só de ida para Alto Paraíso de Goiás. Mas meu estofo é outro. Preciso de segurança, portanto jamais abriria mão do caminho que já estou trilhando sem ter outro seguro para enveredar.

A forma responsável que eu conheço de “jogar tudo para o alto e começar de novo” é prestar o vestibular e começar uma nova trilha. Tentar um novo caminho, abrir uma nova picada. Dar uma “sacudida” no próprio status quo.

Prestar um vestibular tb é uma forma de testar-se. Verificar se tanta empáfia que nutrimos a respeito de nós próprios ainda é válida ou já expirou por caduquice. Como eu já havia passado, nos tempos do cursinho, tanto na USP como na Unicamp, eu sabia que teria reais chances de ser aprovada caso prestasse um desses vestibulares. Eu sabia que, caso passasse numa dessas Universidades, eu simplesmente não teria coragem de abrir mão da vaga, teria que fazer juz a ela. Para tanto, seria obrigada a me mudar de Rio Claro, deixando uma avó Tula na mão, e abandonar meus 2 empregos, sem nenhuma garantia de sustento após minha mudança.

Mudar de cidade ou “sair de casa” para fazer faculdade é uma aventura à qual apenas nos podemos lançar se temos alguém que nos dê back-up, que nos apóie e garanta nosso sustento durante os estudos. Com isso contei durante minha graduação em História na USP. Mas meu avô Vicente faleceu assim que me formei, e eu não teria nesse segundo curso quem “me garantisse” que eu não iria passar fome ou ter que me degradar, como infelizmente muitas universitárias fazem, o que para mim sempre esteve completamente fora de cogitação.

Voltemos portanto a 2009, comigo à procura de um novo rumo. Não tive coragem de me inscrever num “vestibular”, mas ainda assim pretendia “me testar” para ver se eu continuava tão afiada como à época em que passei em meu primeiro vestibular. O melhor jeito de “me testar sem compromisso” seria fazer o ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio.

Eu já havia prestado o ENEM em sua primeira edição, quando eu mesma estava encerrando o Ensino Secundário. Eram à época 63 perguntas, das quais acertei 52, o que me garantiu creio que 3 pontos a mais na FUVEST, vestibular da USP. Com os anos, o ENEM evoluiu. O número de perguntas subiu para 40 por área do conhecimento, mais uma enorme redação. Prova massacrante, em 2 dias. Na minha sala, sentei ao lado de um ex-aluno que se surpreendeu enormemente ao me ver ali, como um alienígena entre adolescentes. Talvez tenha temido que eu estivesse lá para o abduzir... rsrsrs...

A organização do ENEM fez o possível para que os testados não soubessem quais e quantas questões acertaram. Não foi disponibilizado o papel de gabarito que os alunos levam para casa a fim de conferir suas respostas. Ao perceber isso, antes das provas serem distribuídas, perguntei aos fiscais se podia deixar uma folha completamente em branco sobre a mesa para anotar e depois conferir minhas respostas.

- De jeito nenhum! Sobre a mesa, apenas lápis, caneta, borracha, RG e a ficha de inscrição.

Blz. Dei um “jeitinho milimétrico” e anotei todas as minhas respostas, dos 2 dias, em minha ficha de inscrição. E foi só por isso que fui uma das poucas que pôde conferir seus acertos. E isso foi curiosíssimo pois pude verificar que, mesmo sendo formada e professora de História, errei algumas perguntas dessa disciplina, enquanto que na área de “Linguagens e Códigos”, simplesmente, gabaritei.

Neste ENEM 2010, como creio que acontece em todas as edições, houve uma quebra de protocolo. Neste ano em particular, foi na impressão das provas amarelas, que vieram erradas, prejudicando milhões de estudantes. A minha foi a de cor azul e portanto não fui, por sorte, prejudicada pela desorganização dos assim chamados “organizadores” do ENEM.

2010 também foi o primeiro ano em que o ENEM foi utilizado como única prova de seleção para muitos Institutos e Universidade Federais, que aderiram ao SISU, Sistema de Seleção Unificado. Apurados todos os resultados, ao final de janeiro os que haviam prestado a prova deveriam se inscrever no SISU para ver se suas notas os haviam qualificado para alguma vaga em algum lugar do país.

Claro que tudo que parece tão lógico e bonitinho, no Brasil não funciona tão direito assim. Houve uma enxurrada de milhões de acessos simultâneos e, lógico, o sistema caiu. O SISU rapidamente se tornou o SIFU, bombando no Twitter. Milhões não conseguiam sequer se logar no sistema, quanto menos visualizar e selecionar suas opções.

Lá pelo terceiro dia, em hora madrigal bastante aversa, consegui me logar e verificar minha notas em cada habilidade. De cabeça, me lembro que em redação tirei creio que 821. Minha média global remontava a impressionantes 742 pontos num universo em que a “normalidade” estava estabelecida em 500.

Descobri que minha nota me habilitava para diversos cursos, em diversos estados da federação. Como não pretendia ir tão longe, verifiquei especificamente para o estado de SP. Me interessei pela vaga de “História da Arte” na recém-inaugurada Federal de Santos. Também tinha nota para diversos cursos na Federal do ABC. Mas eu não pretendia ir tão longe.

Próximo a Rio Claro, o único campus era o de São Carlos, a 1 hora de viagem. Este campus oferecia um único curso: Tecnólogo em Análise de Sistemas. Sinceramente, como sei de minhas graves deficiências em Exatas, eu jamais considerei a possibilidade de ser aprovada no vestibular de uma “Pública” para Exatas. No máximo, na Física ou Matemática, pouco concorridas. Mas não. Descobri que sim, meus 742 pontos me habilitavam como nona colocada no curso de Tecnólogo em Análise de Sistemas no Instituto Federal São Carlos, que funciona no Campus da UFSCAR.

Me inscrevi on line. :) Uma nova janela, uma nova possibilidade de um futuro radicalmente diferente, se abria diante de mim. Estudando em São Carlos, eu não precisaria me mudar de cidade. Poderia continuar morando com minha avó e todas as noites fazer a viagem de ida e volta.

Claro que os projetos imaginários sempre são mais brilhantes e têm cores mais belas que a realidade. Estudando à noite eu teria que abrir mão de trabalhar no turno que garantia a maior parte de meu sustento. Teria que empreender viagem a outra cidade 6 dias da semana, pois teria aula inclusive aos sábados pela manhã, e aula de uma disciplina tão temida quanto renomada “Lógica”... Teria que me esmerar em estudos numa área completamente estranha, com símbolos completamente desconhecidos, aprendendo linguagens completamente inauditas. Chegaria em casa depois da meia noite para ter que estar em sala de aula, a mil por hora, já às 7 da matina. Teria que abrir mão de qquer tipo de “vida social” presencial, não-virtual, que pretendesse ter. Teria que gastar os tubos com a mensalidade da van. Tudo isso elevado ao cubo, pois eram 3 anos de curso.

Mas em princípios de fevereiro não vi nada disso e tudo me pareceu translúcido quando fui, pela primeira vez na vida, à pujante cidade de São Carlos. Nem sabia o caminho. Pedi que minha amiga filósofa Rafaela me acompanhasse, pois ela já havia estado na cidade. Juntas fomos em meu carro até a UFSCAR, e com muita alegria tive companhia ao fazer minha matrícula. Só quem já passou no vestibular de uma Universidade Pública sabe a alegria que é, depois de todo um périplo, de tantos sonhos e projetos, finalmente poder entregar as cópias de seus documentos, oficializar sua matrícula e sentir-se parte de um mundo diferente, universitário. Passar no vestibular lava a alma. É uma realização que ninguém, jamais, poderá tirar de nós.

Feita a matrícula, “mexi meus pauzinhos” para possibilitar que, de fato, pudesse freqüentar o curso, realmente, a sério. Contratei a van, a R$270,00 por mês. Na atribuição de aulas, dolorosamente abri mão de pegar aulas à noite. Depois descobri que por conta disso, minha renda havia caído para menos de mil reais. Com um terço disso comprometido só pela van. Por mais sem ar que isso me deixasse, o real motivo para minha desistência não foi financeiro, mas a soma de cansaço e medo.

Cansaço pois de fato era extenuante viajar todos os dias a São Carlos. Medo pois percebi que teria, de fato, que me esforçar. Teria que quebrar minha cabeça, deglutir em poucos meses um volume inteiro de “Matemática para o Ensino Médio” só para sanar minhas deficiências escolares e poder então estar pari passu para poder me aventurar na Matemática de nível Superior.

Cálculo é algo que para mim se dá à manivela, à luz de velas, no máximo movido a vapor, carvão ou querosene. Tive medo de tentar, quebrar a cabeça, e ao final, não conseguir. Medo que nunca tive diante dos temidos professores da FFLCH, do Francisco Murari, da Márcia Berbel, da Zilda Iokoi. Por mais que suas avaliações fossem difíceis, eu sabia que poderia desenvolver meus raciocínios numa linguagem que domino e conseguiria, no mínimo, algum nível de meio certo.

Em Exatas, não há meio certo. Não há tanto espaço para análises, para outros pontos de vista. Por medo de me esforçar e, ainda assim, falhar, pipoquei, ou “amarelei”. Por 3 meses fui religiosamente às aulas, com relativo sucesso. Fazia participações e comentários que enriqueciam nossas sessões, colhendo em troca muitos olhares admirados de meus colegas, muitos já profissionais da área de informática e mais velhos que eu. Em nenhum momento me considerei “aquém dos demais”, nem nas disciplinas especificamente “exatas”. Mas ainda assim tive muito medo. No dia da primeira prova de “Matemática Básica”, para a qual eu realmente havia estudado bastante, mas não me sentia segura de dominar o conteúdo, ponderei se minha coragem era suficiente para ir e tentar, com a possibilidade real ou imaginária de recolher um retumbante fracasso.

Não me orgulho, mas admito que meu medo superou minha coragem e faltei a prova. Depois disso não tive mais coragem de voltar ao curso. Apesar desse amargor, o gosto que se sobressai ao final da degustação dessa experiência é doce. Fiz novos amigos. Aprendi coisas sobre computação que jamais sonhei saber. Conheci todo um novo mundo e as bases da linguagem da computação. Conhecimentos que já pus em prática em textos publicados neste blog.

Essa experiência também me ajudou a parar de reclamar um pouco de minha vida e parar de ver meus caminhos como fechados. Me trouxe a consciência de que, sim, eu ainda sou capaz de passar no vestibular de uma Universidade Pública, mesmo mais de 10 anos após egressa do Ensino Médio. Me mostrou que todo o mundo está aberto diante de mim, basta eu ter um foco, escolher um caminho e engendrar minhas forças. Qualquer mudança ou novo rumo que eu queira dar à minha vida está aberta diante de mim.

Basta ter coragem para decidir e força para perseverar.

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