quinta-feira, 30 de junho de 2011

Família Suplicy, os Kennedy’s brasileiros

Numa República, por princípio, não deveriam se formar dinastias familiares. Mas quem disse que vivemos numa verdadeira República, ou que qualquer lugar já a tenha posto em prática em sua forma idealmente prescrita? Muitos são os casos de grupos familiares serem sucessivamente alçados ao poder pelo voto popular. E muitos são os políticos que embora não descendentes, proclamam-se herdeiros de figura política ancestral e reverenciada.

Alguns exemplos brasileiros. Em SP temos o ilustre caso dos 3 irmãos Andrada e Silva: José Bonifácio, Martim Francisco e Antônio Carlos . No Maranhão temos o exemplo deletério da família Sarney. Na Bahia, os Magalhães. No Rio de Janeiro os “Garotinho”.... Em Minas, nasce a dinastia Neves, de Tancredo e Aécio.

A formação de dinastias republicanas não é fenômeno exclusivamente brasileiro. Nossos hermanos argentinos têm certo pendor peronista, recentemente materializado na dinastia Kirchner. No Peru, temos Alberto e Keiko Fujimori. Se Fernando Lugo encaminhar seus filhos à carreira política, faltarão cargos eletivos suficientes no Paraguai para os múltiplos filhos do presidente ex-bispo... Nos EUA são muitas as famílias com vários membros de destaque. As mais óbvias são os Clinton e os Bush.

Historicamente, só para citar famílias sem “sangue azul” é iconográfico o caso de Napoleão Bonaparte e seu sobrinho, Luís Napoleão, que subiu ao trono como Napoleão III. Mesmo contemporâneo, é também histórico o exemplo de Cuba, com Fidel Castro sucedido por seu irmão Raúl. Na Coréia do Norte, a família de Kim Jon-Il encaminha-se para a terceira geração no poder “republicano”...

Porém ocasionalmente algumas dinastias políticas revestem-se de certa aura taumatúrgica. Tal ocorreu nos EUA em relação aos Kennedys. Especialmente por seus dois mais destacados membros, John e Robert, terem se tornado arquetípicos mártires da América.

A Cultura política brasileira é toda outra. Políticos brasileiros não são assassinados por cidadãos malucos, ou por Conspirações da CIA, mas por simples jagunços e pistoleiros. Os políticos brasileiros não costumam ter mortes grandiosas. Pelo menos desde o suicídio de Getúlio Vargas. Minto. Desde o desaparecimento de Ulysses Guimarães, que fosse mais jovem e com “apelo midiático”, teria memória muito mais celebrada.

Político sui generis no desolador cenário político brasileiro é o “eterno” Senador por São Paulo Eduardo Matarazzo Suplicy. O “Matarazzo” já é toda uma declaração a respeito da classe social de qquer um que porte este sobrenome no estado de SP. Numa frase curta, os oriundi Matarazzo obtiveram o titulo nobiliárquico de “Conde” sob o Império de Pedro II.

Eduardo Suplicy encarna uma verdadeira bandeira em prol da retidão. Sua persona emana segurança, dignidade, republicanismo. Outra característica maravilhosa do senador Suplicy, apanágio das pessoas muito bem-resolvidas, é que ele não tem medo de rir de si mesmo, não se sente na necessidade contínua de “manter a compostura”. Suplicy tem “compostura” intrínseca e pode, portanto, impunemente, prescindir de qquer “pose”. É figurinha carimbada e carinhosamente reverenciada nos programas de humor jornalístico. Não teve medo de vestir a sunga vermelha de super-homem que Sabrina Sato lhe ofereceu via Pânico na TV (e que o programa, em respeito ao Senador e para não complicá-lo na hilariante “Comissão de Ética do Senado” não levou ao ar, deferência que nenhum outro político receberia...)

Recentemente, participou de um “detector de mentiras” no programa CQC - Custe o que Custar. Na matéria ele era apresentado como “um político que nunca mente”. Aplicaram-lhe o teste com várias perguntas espinhosas, às quais qquer político se furtaria em responder. Não alguém seguro de uma honra imaculada. O detector acusou mentiras? Rsrsrs... Claro! Uma das perguntas foi se o casamento com Martha Suplicy foi “fácil”. Após pensar, disse que sim. Mentira! Quem conhecer 1 só casamento fácil que atire a primeira pedra. Outra pergunta foi se alguma vez ele teve vontade de “dar na cara” da Martha. Após ponderar, disse não. Mentira! Confrontado com o resultado, explicou em seu reticente tom de bom-moço: “Posso até ter pensado, mas nunca, jamais, realizei nada neste sentido”. Verdade! Quem nunca teve vontade de esmurrar aos mais próximos que atire a primeira pedra. De todas as perguntas de escopo político, Suplicy graduou-se com louvor. E com verdade. Afirmou claramente nunca ter recebido presentes de lobbistas. VERDADE!!!!

Detalhe pertinente das diferenças entre EUA e Brasil é que um político como Eduardo Suplicy, apesar de todos os seus méritos pessoais e sua ética imaculada, jamais teria uma carreira de destaque entre os preconceituosos e mui conservadores yankees. Seria guilhotinado por sua família. Nos EUA esposas de políticos devem ser donas de casa modelo, no máximo, políticas que serem-lhes apenas de sombra. E seus filhos, mauricinhos engravatados. Eduardo Suplicy foi casado longamente com uma sexóloga e seu filho mais famoso (seu Júnior) é também o punk mais famoso do Brasil: Supla.

Na década de 1980 Marta Sulicy ficou famosa por apresentar um programa na TV sobre sexo, ao lado de Marília Gabriela. Também na década de 1980 Supla chocava o Brasil com seus ilhoses, seu cabelo moicano e suas músicas horrendas. Uma esposa que fala sobre obscenidades na TV e um filho aparentemente drogado seriam suficientes para fadar ao fracasso a carreira de qquer político americano. Creio que o sucesso de Suplicy no Brasil diz algo de bom sobre a tolerância cultural de nossa nação.

Mesmo assim parecia algo meio “fora de lugar” o roqueiro multi-colorido Supla naquela que poderia ter sido a família Dó-Ré-Mi brasileira. Mas se há algo de curioso e reflexivo na vida é que o mundo dá muitas, muitas voltas. Quem hoje está por cima, amanhã está por baixo. Quem hoje é desprezado amanhã será honrado. E ninguém sabe para que rumo a roda da vida há de nos levar.

Para a família Suplicy isso se deu no programa “Casa dos Artistas”, o Big Brother com famosos que foi ao ar no Brasil pelo SBT de Sílvio Santos. Cujo casting contava com o pseudo-artista Supla. Até sua entrada nesse programa, todo o Brasil tinha uma visão pré-concebida de Supla como um “punk”: rebelde, grosseiro, violento, mal-educado. Uma fruta podre uma família de bem, depondo contra seu pai enquanto “bom gestor” e sua mãe como “psicóloga”, e contra ambos como políticos. Supla era o turn-off, o ponto baixo na biografia de seus pais. Até que o Brasil o conhecesse.

Em “Casa dos Artistas I” o Brasil teve uma das poucas boas surpresas políticas de sua história. Supla revelou-se um verdadeiro gentleman: educação principesca, gentileza, razoabilidade, pontos de vista esclarecidos, ausência de preconceito, disposição em ajudar, conversar, aconselhar, personalidade afável. Quem assustava por sua aparência cativou ao Brasil por sua docilidade. Desde o começo do programa até seu último episódio, Supla era o franco favorito. E teria ganho. Na verdade ganhou. Supla e a família Suplicy foram os grande vencedores da “Casa dos Artistas”, embora Eduardinho Júnior não tenha ganho o prêmio, para surpresa de todos, no último minuto.

Recomendo a todos assitir ao episódio final deste programa. Foi eletrizante. Ao longo dos meses de episódios de confinamento, vimos nascer um romance inspirador entre o garoto rebelde mais querido do Brasil e o membro menos conhecido dentre os “artistas” selecionados: a atriz Bárbara Paz. O grande público nunca ouvira falar dela. E, junto com Supla, o Brasil foi aos poucos se enamorando desta gaúcha de triste história. Lindo foi o entrosamento de ambos. E muitos telespectadores viram-se diante de uma história moderna de “Cinderella”.

Supla teria ganho, não fosse ele rico. E não tivesse o Brasil percebido que, para ele, ganhar algumas centenas de milhares de reais não faria diferença a um Matarazzo. Já para a neo-princesa seria determinante. Ninguém, muito menos a própria Bárbara, achava que ela ia ganhar. Isso fica claro ao assistir ao episódio final, com ela quase dissolvendo-se no sofá, o rosto marejado displiscentemente manchado de delineador. Após a revelação final do ganhador, lindíssima foi a cena de ela sendo recebida pelo rei e pela rainha-mãe, então prefeita de São Paulo. E terno foi o gesto de Marta ao ajeitar a maquiagem na nora que só então conhecia, mas por quem o Brasil inteiro já se apaixonara.

Não fosse o programa “Casa dos Artistas” o Brasil continuaria apensar: “Como um cara tão bom como o Suplicy não deu um jeito no Supla?” e “Como uma psicóloga pode criar tão mal um filho a ponto de ele virar punk?” Mas veio a Casa dos Artistas e a gentileza e fino trato de Supla demonstraram cabalmente ao Brasil como as aparências enganam.


Update 10 anos depois:

Eduardo e Martha Suplicy divorciaram-se. Ela casou-se com um argentino. Curiosamente, isso não resultou num suicídio político. Hoje já estão separados.
Em 2010 Martha foi eleita Senadora por SP. Portanto, dos 3 Senadores a que SP tem direito, hoje 2 atendem pelo sobrenome Suplicy.
O namoro de Supla de Bárbara Paz não durou muito. Hoje ela é uma respeita atriz, casada com o diretor de cinema, curiosamente também argentino, Hector Babenco.
Hoje em dia Supla apresenta, ao lado de seu irmão "mais cool" João Suplicy, o programa jovem e musical "Brothers". Supla continua a cultivar o look "Punk", apesar de já passado dos 40 anos de idade...
Nenhum dos filhos do casal Suplicy parece inclinado a enveredar pela carreira política.

A única música de "sucesso" de Supla é "Japa Girl". Gravada na década de 1980.

Um comentário:

  1. Cara Fernanda,
    vim cá conhecer uma das mais novas seguidoras do blog onde escrevo e mostro algumas coisas que penso e faço...e inadvertidamente.....dou com um blog maravilhoso, que analisa fatos históricos,o que muito aprecio.
    Gostei tanto, que me tornei sua seguidora....
    Abraços cá de Portugal

    Maria Filomena

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