Meus interlocutores nessa questão não são apenas os demais professores e teóricos da educação, mas todos os que se interessam pelo cultivo da cidadania no Brasil. Não são somente os especialistas e profissionais os que devem se preocupar com a educação, mas todos, pois todos passaram, passam, ou passarão pela escola, cada vez mais amplamente universalizada e pq não pasteurizada. Toda a sociedade brasileira é permeada pela questão da educação pública.
Ensinar História de certa forma é mais fácil do que outras matérias pois temos a inexorável ordem cronológica. E é com base nesse compasso que o currículo é dividido em séries, da seguinte forma (tomando como base o currículo do Governo do Estado de SP):
5ª série: da Pré-História à alta Idade Média
6ª série: da alta Idade Média ao séc. XVIII
7ª série: do século XVIII ao XIX
8ª série: o século XX
Parece ótimo, não é? Só parece. Porque o currículo é reprisado no Ensino Médio, da seguinte forma:
1º colegial: da Pré-História à baixa Idade Média
2º colegial: da baixa Idade Média ao séc. XIX
3º colegial: séculos XIX e XX
Ou seja, o conteúdo do Ensino Fundamental se repete no Ensino Médio. Teoricamente “de maneira mais aprofundada”. Além de maçante, essa estratégica curricular é contraproducente. No Fundamental, os alunos não estão preparados para lidar com diversos conceitos político-sociológicos. No colegial, como eles se lembram vagamente do conteúdo anteriormente ministrado, acham que já sabem o que o professor está ensinando.
Tive um insight a respeito disso ano passado, quando de repente me vi tentando explicar a Revolução Francesa para alunos da sétima série, com 13 anos. Pura perda de tempo. Eles não sabiam o que era Monarquia nem Antigo Regime, onde fica Versalhes ou mesmo a França, ou pq Napoleão Bonaparte era diferente de Alexandre, o Grande ou Carlos Magno. Ou sequer quem eles eram, e os séculos que os separavam. Também não conheciam o significado das palavras “clero”, “plebe” e “nobreza”.
Longe de mim considerar a Revolução Francesa desimportante. Eu sei de sua importância justamente pq gosto tanto de História que fiz faculdade disso. Porém, digamos que apenas 2% dos meus alunos gostem de História a esse ponto. Pq os outros 98% deveriam ser obrigados aos 13 anos a decorar as diferentes fases da Revolução Francesa, coisa que mesmo durante a faculdade foi-me dificílimo conseguir?
O currículo do Ensino Fundamental deveria ser despido de sua pretensão vestibulárica e científica. Pessoas que se formem apenas no Ensino Fundamental não precisarão lidar com conceitos que envolvam coisas como a Revolução Francesa. E se aprenderem na preciosa carga horária destinada à História apenas coisas abstratas, distantes no tempo e no espaço, sem nenhuma conexão com sua realidade, este tempo será, na prática, desperdiçado.
A matéria de História no Ensino Fundamental deveria ser uma introdução à reflexão e às Ciências Humanas. Não deveria contentar-se em passar a velha decoreba dos fatos que se sucederam ao longo do tempo. Deveria ser um guia de compreensão da realidade.
Defendo que a matéria História do Ensino Fundamental não ensine História. Que não ensine o ontem, mas o hoje. Que use o ontem na medida em que ele elucida o hoje. Que o ensino de História do Brasil parta da realidade atual brasileira. Que o ensino da escravidão parta da atual desigualdade racial brasileira. Que o estudo de Grécia e Roma tenha como escopo explicar a cidadania e a política atuais do Brasil. Os exemplos são infinitos, não pretendo aqui sistematizar uma proposta completa, apenas dar a deixa para uma reflexão; apresentar uma alternativa que creio seja não só necessária como emergencial.
Ao invés de desperdiçar anos ensinando coisas que os alunos esquecerão pois nunca mais usarão, o Ensino Fundamental de História deveria preparar seus alunos para entender e agir no mundo da política e da cidadania. Deveria dar-lhes ferramentas práticas, e não teóricas, de intervenção na realidade. Para isso serão necessárias muitas vozes, e uma ampla reflexão da sociedade sobre o que ela espera da educação pública brasileira.
Ensinar História de certa forma é mais fácil do que outras matérias pois temos a inexorável ordem cronológica. E é com base nesse compasso que o currículo é dividido em séries, da seguinte forma (tomando como base o currículo do Governo do Estado de SP):
5ª série: da Pré-História à alta Idade Média
6ª série: da alta Idade Média ao séc. XVIII
7ª série: do século XVIII ao XIX
8ª série: o século XX
Parece ótimo, não é? Só parece. Porque o currículo é reprisado no Ensino Médio, da seguinte forma:
1º colegial: da Pré-História à baixa Idade Média
2º colegial: da baixa Idade Média ao séc. XIX
3º colegial: séculos XIX e XX
Ou seja, o conteúdo do Ensino Fundamental se repete no Ensino Médio. Teoricamente “de maneira mais aprofundada”. Além de maçante, essa estratégica curricular é contraproducente. No Fundamental, os alunos não estão preparados para lidar com diversos conceitos político-sociológicos. No colegial, como eles se lembram vagamente do conteúdo anteriormente ministrado, acham que já sabem o que o professor está ensinando.
Tive um insight a respeito disso ano passado, quando de repente me vi tentando explicar a Revolução Francesa para alunos da sétima série, com 13 anos. Pura perda de tempo. Eles não sabiam o que era Monarquia nem Antigo Regime, onde fica Versalhes ou mesmo a França, ou pq Napoleão Bonaparte era diferente de Alexandre, o Grande ou Carlos Magno. Ou sequer quem eles eram, e os séculos que os separavam. Também não conheciam o significado das palavras “clero”, “plebe” e “nobreza”.
Longe de mim considerar a Revolução Francesa desimportante. Eu sei de sua importância justamente pq gosto tanto de História que fiz faculdade disso. Porém, digamos que apenas 2% dos meus alunos gostem de História a esse ponto. Pq os outros 98% deveriam ser obrigados aos 13 anos a decorar as diferentes fases da Revolução Francesa, coisa que mesmo durante a faculdade foi-me dificílimo conseguir?
O currículo do Ensino Fundamental deveria ser despido de sua pretensão vestibulárica e científica. Pessoas que se formem apenas no Ensino Fundamental não precisarão lidar com conceitos que envolvam coisas como a Revolução Francesa. E se aprenderem na preciosa carga horária destinada à História apenas coisas abstratas, distantes no tempo e no espaço, sem nenhuma conexão com sua realidade, este tempo será, na prática, desperdiçado.
A matéria de História no Ensino Fundamental deveria ser uma introdução à reflexão e às Ciências Humanas. Não deveria contentar-se em passar a velha decoreba dos fatos que se sucederam ao longo do tempo. Deveria ser um guia de compreensão da realidade.
Defendo que a matéria História do Ensino Fundamental não ensine História. Que não ensine o ontem, mas o hoje. Que use o ontem na medida em que ele elucida o hoje. Que o ensino de História do Brasil parta da realidade atual brasileira. Que o ensino da escravidão parta da atual desigualdade racial brasileira. Que o estudo de Grécia e Roma tenha como escopo explicar a cidadania e a política atuais do Brasil. Os exemplos são infinitos, não pretendo aqui sistematizar uma proposta completa, apenas dar a deixa para uma reflexão; apresentar uma alternativa que creio seja não só necessária como emergencial.
Ao invés de desperdiçar anos ensinando coisas que os alunos esquecerão pois nunca mais usarão, o Ensino Fundamental de História deveria preparar seus alunos para entender e agir no mundo da política e da cidadania. Deveria dar-lhes ferramentas práticas, e não teóricas, de intervenção na realidade. Para isso serão necessárias muitas vozes, e uma ampla reflexão da sociedade sobre o que ela espera da educação pública brasileira.
Adorei seu artigo... Verbalizou o sentimento de muitos... Parabéns.
ResponderExcluirAdorei seu artigo... Verbalizou o sentimento de muitos... Parabéns.
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