quinta-feira, 6 de março de 2008

Eu

Justo eu,tão certa de ser eu mesma
Agora não mais me sinto tão segura
Que não serei incluída na resma
E olho-me com tal candura

Vejo o rosto desfigurado
Que já não me é atribuído
Com tal olho marejado
Lá não me vejo reconhecido

Vejo, mas não mais me conheço
Antecede, ainda que similar
Mesmo, mas em muito difere
E neste desatino adormeço
E com minha (ou será tua) própria língua fere
Não mais minha personalidade
Neste rosto poderei encontrar
E a minha própria identidade
Com ele veio a se misturar

Eu, tão segura de ser, de si
Vejo-me em pranto teu
Espelhando as lágrimas de Orfeu
A desdita do jovem Romeu
De dar-me a chave ele esqueceu

Rosto tão belo quanto Deus me deu
Não mais me reconheço no meu
Não mais segura de que eu mesma seja o eu.

(1998)

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